O por quê da "Divina Comédia"

Desde criança sinto verdadeira atração pelas estrelas. Na fazenda de meu pai, - município de Itabuna – Bahia, não havia iluminação elétrica, por isso, enquanto meus irmãos sob a vigilância de meus pais brincavam como qualquer criança, eu, deitada sobre o gramado ficava a contar e descobrir novas estrelas. Achava lindo, o céu! O luar então me deslumbrava e ainda hoje me encanta. Meu pai, meu grande amigo, homem simples mas inteligente e culto, vendo meu interesse em conhecer os mistérios do Universo, me dava como presente tudo o que encontrava de interessante sobre o assunto, como mapas indicando a posição das estrelas e os nomes das constelações; e outros, dentre eles a “Divina Comédia”. Porém não conseguia ler seus versos; dizia que eram escritos “de trás para a frente”, mas sabia que Dante Alighieri tinha ido às estrelas. Então guardei o livro com muito carinho, pensando: quem sabe, um dia... Passaram-se 55 anos até que em Janeiro do ano 2.000, início do 3º milênio, me veio a inspiração: vou ler, e o que for compreendendo, vou escrevendo; tudo manuscrito. Meditei, conversei com Dante, pesquisei História Universal, Teologia, Religião, Mitologia, Astronomia... durante oito anos.
Agora, carinhosamente, quero compartilhar com vocês o resultado desse trabalho, que me fez crescer como mulher e espiritualmente. Espero que gostem.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

O Pug. CANTO IX

Ao despertar do novo dia Dante adormece e, no sono, é transportado por Luzia até a Porta do Purgatório. Aproximam-se da entrada e aqui um anjo abre-lhes a porta, depois de ter gravado na testa de Dante sete PP.
Texto do Tradutor.

"Quem vos guia até aqui?

Já concubina do Titão antigo exibia as douradas franjas sobre o nascente deixando os braços do seu doce amigo. (A concubina do Titão, é a aurora), Sua fronte apresentava-se ainda refulgente de astros formando a figura de um animal frio que vibra a cauda contra a humana gente. (A constelação do Escorpião.) A noite já havia percorrido duas horas e se aproximava da terceira quando eu, herdeiro de Adão, vencido pelo sono lá mesmo onde nos encontrávamos sobre a relva deitei-me e adormeci. Antes do amanhecer, na hora em que a andorinha começa a emitir seus tristes soluços talvez r
ecordando seu antigo sofrimento, não mais sentindo meu espírito preso pelo medo, sentindo-se livre do padecer terreno, fui tomado por visões, que me pareceram divinas. Via pairar no ar uma tranqüila águia de douradas plumas que pelo movimento das asas demonstrava querer baixar o vôo. Imaginava eu estar na montanha de onde Ganimede fora levado para se dedicar à excelsa coorte. (Júpiter fez raptar Ganimede para servir de copeiro aos deuses, no Olimpo.) E eu pensava: talvez essa ave não querendo caçar noutros lugares, exibe aqui a lustrosa plumagem chamando a atenção da presa que quer levá-la consigo. Então, depois de dar várias voltas, veloz como um raio sobre mim se atira e me leva a região do Fogo. Pensei que essa águia estivesse se incendiando juntamente comigo; e a veracidade do calor era tão real, que meu sonho foi interrompido pela intensidade do falso fogo. Nem Aquiles, quando sua astuciosa mãe o retirara de Quiron e levarara a Seiro, ainda adormecido, ao acordar olhando ao redor e não compreendendo onde estava ficou mais espantado do que eu (Tetis, mãe de Aquiles, ocultamente o retirou de Quiron e o levou para Seiro de onde os gregos Ulisses e Diomedes o conduziram à guerra de Troia) ao sentir o sono fugir-me das pálpebras e vendo-me pálido, quase desmaiando, transtornado de horror. Naquele instante eu só via ao meu lado Virgílio; já o sol se afastara do nascente há duas horas e eu mantinha o olhar fixo no mar. “Não temas”; disse-me o Mestre. “Ficas tranqüilo, pois o bom porto não está distante; daqui, já se avista o Purgatório; o rochedo o envolve impedindo a visão do seu aspecto, mas, onde se vê uma fenda no muro de rocha, aí é a entrada. No dia anterior, ao romper da aurora, quando estavas dormindo sobre a relva coberta de flores, eis que apareceu uma Dama nos dizendo: ‘Sou Luzia; vou levá-lo enquanto dorme; assim a jornada lhe será mais leve’. Sordello e as outras nobres almas ficaram no mesmo lugar que estavam; e como já raiasse o dia, te apanhou nos braços, subiu e eu segui seus passos; com muita delicadeza deixou-te aqui; e com o olhar me indicava que próxima, ali estava aberta a entrada. Depois se foi, e o sono te deixou”. Como alguém quem estando em dúvida apenas reconhecendo a verdade transforma o seu temor em confiança, assim fiquei; e o Mestre percebendo que eu já estava recuperado do susto e temor, foi subindo a montanha e eu o segui.
Vês Leitor, como está se tornando elevado o tom do meu estilo; e não fiques admirado, se mais arte e mais brilho lhe acrescentar de agora em diante. Já nos aproximávamos da parte do rochedo onde antes eu divisara como sendo uma fenda na muralha. Ora! O que havia era uma porta com três degraus, cada qual de cor diferente, sendo que a porta estava guardada por um imóvel e silencioso porteiro. Porem olhando mais de perto, o vi claramente sentado no degrau mais alto, tendo a face tão fulgurante, que me ofuscava. Com a mão direita segurava uma espada que sobre nós refletia seus raios. Deslumbrado tentava eu fixar nela, o olhar, mas não conseguia. Vendo-nos aproximar disse:
“Parai e respondei-me que pretendeis e quem vos guia até aqu
i? Não temeis os efeitos dessa ousadia?”. Respondeu Virgílio: “Uma Dama, vinda do Céu, mesmo conhecendo essas conseqüências, nos ordenou: ‘Ide! Não fica longe a desejada entrada”. Então respondeu-nos o anjo: “Que ela ilumine vossos passos; subais, pois, os nossos degraus!”. Subimos: o primeiro degrau era de mármore tão branco, tão polido, que a minha imagem nele se refletia. O segundo era formada de tosca pedra, não polido e parecia ter sido queimada; estava fendida na largura e no comprimento. O terceiro formado de rocha cristalizada tinha a cor de vermelho flamejante, qual sangue que flui de uma veia rasgada. Neste degrau é que o resplandecente anjo firmava os pés, porém estando sentado à soleira da entrada, que me pareceu ser feita de um só diamante. Acompanhado por Virgílio fui subindo jubiloso. Então ele me disse: “Deves suplicar com humildade, que a porta te seja aberta!”. Aos sacros pés curvei devotamente a fronte e batendo no peito com os dedos três vezes, pedi-lhe que, por misericórdia, a porta fosse aberta. Com a ponta da espada o anjo gravou na minha testa, sete vezes a letra P (os Ps são oa sete pecados mortais) dizendo: “Quando estiveres lá dentro, arrependido lava estes traços, que são sinais do pecado". Terminando de falar, tirou ele de sob as vestes que eu percebera ser da cor de terra seca ou cinza, duas chaves, sendo uma de ouro outra de prata. Disse: “Primeiro, usa a chave branca e logo após a dourada, e abre a porta”. Foi então completa a minha alegria! Disse o anjo: “Se uma das duas chaves não fizer funcionar a fechadura, isto significa que a entrada não foi permitida. Se um pecador tem mais culpas a pagar, uma ou outra necessita de mais habilidade para abri-la. A dificuldade que apresentam as molas, indica a severidade da prisão. Ordenou-me Pedro ao confiá-las a mim que, aos que suplicam ansiosamente entrar, é melhor errar abrindo-a, do que fechando”. E tocando na santa entrada ainda nos diz: “Entrai; mas de agora em diante, vos previno, quem olha para trás, é lançado para fora”.
Então, os portões do divino recinto se movem e os espigões giraram rangendo nos gonzos de metal fino em som estridente. As portas de Tarpéia não se abriram com maior estrondo quando foram roubados o tesouro publico, apesar dos esforços de Melelo, do que essas. (as portas do Purgatório se abriram com maior estrondo do que o produzido pelas portas da rocha Tarpéia quando, apesar da resistência de Ceccilio Metelo, Julio César as abriu para apoderar-se do dinheiro público.)

Atento, julguei ouvir os rumores de um suave coro a entoar o Te Deus laudamus”. Ouvindo-o, em mim ficava a sensação que nos envolve quando a voz bem modulada é acompanhada por ternos sons de órgão bem tocado que, enquanto uma voz silencia, outra se estende.



O PUR. CANTO VIII

No começo da noite dois anjos descem do Céu para expulsar a serpente maligna que quer entrar no vale. Entre as sombras que se aproximam dos Poetas, Dante reconhece Nino Visconti, de Pisa. Conrado Malaspina pede a Dante notícias de Lunigiana, sua pátria; Dante responde elogiando a sua família. Texto do Tradutor.

"Eis o Inimigo..."

Era a hora em que o coração do navegante relembrando o dia do adeus, mais saudade sente dos amigos distantes; e também o daquele que, estando longe do seu amor ouve o lacrimoso som do campanário que anuncia o final do dia.

Parando de escutar o canto, voltei o olhar e vi perto um espírito que, levantando-se, acenava-nos pedindo que o ouvíssemos. E erguendo as mãos juntas em prece, com o olhar fixo no Oriente, parecia dizer a Deus: “Te lucis ante,...”“És todo o meu desvelo!” (começo de um hino da Igreja)entoou ele o piedoso canto com tanta suavidade, que o meu pensamento me enlevou em êxtase; e com igual devoção e igual encanto, todos, com o olhar fitando as supremas alturas fez-me ausente a tudo...

Leitor tenha agora os olhos da alma preparados para nos tão sutis e tão delicados véus da verdade penetrá-los. (O Poeta adverte que além do sentido literal, o que vai dizer tem um sentido alegórico.)Terminado o cântico percebi que a multidão, pálida e humilde observava o céu como que esperando. Então vi descendo das infinitas alturas dois anjos empunhando flamejantes espadas, cujas pontas eram mutiladas. Verdes quais folhas novas vicejantes eram suas vestes; com as magníficas plumas de suas asas agitando, um deles junto a nós pousou, enquanto o outro foi se colocar do lado oposto, ficando a multidão de almas reunidas entre eles. Eu conseguia ver seus lindos cabelos louros, porém contemplar seus rostos seria impossível, pois me ofuscaria a visão. Disse Sorello:“Ambos vieram do trono de Maria para proteger esse vale, da serpente que está para chegar”. Ignorando por onde a ímpia serpente pudesse aparecer, olhei ao redor e, tomado de terror busquei refúgio junto ao caro amigo. Sordello então continuou: É chegado o momento de falar com aqueles espíritos altos; ficarão muito alegres com a vossa presença”. Para descer ao vale me foi bastante dar três passos que me fizeram sentir que em meio à multidão um espírito fixava a vista indagadora em meu semblante; o ar já se carregava de sombras, mas, não impediam aos seus e aos meus olhos de reconhecer alguém que ali estava; então, vem ele em minha direção e eu a ele e apressando o passo digo: “Nino! Ó excelente juiz! Quanto me alegra ver-vos e saber que não estais na infernal morada!” (Ugolino Visconti juiz de Galura, na Sardenha). Depois de repetidas demonstrações de afeto, perguntou-me: “Há quanto tempo chegaste ao pé desta montanha, após ter atravessado o imenso mar?”. Respondi: “Oh! esta manhã, não atravessando o mar, mas depois de ter passado pela terrível mansão. Ainda gozo da vida terrena; e quanto a vida eterna vou buscando merecê-la”.

Ainda não tinha terminado de proferir esta resposta, quando Nino e Sordello pasmados, recuaram, como se tivessem escutado algo maravilhoso. Voltou-se Sordellopara Virgílio, enquanto ouvia-se a voz de Nino falando a outro: “Vem Conrado! Vem ver o que as leis de Deus determinaram!” E voltando-se para mim: “Pela gratidão que deves ao Supremo Ser por essa atitude que é vedado à nossa compreensão, imploro-te que, assim que tenhas atravessado o tortuoso mar e chegado ao mundo dos vivos, diga a minha filha (Joana, filha de Nino) que suplique a Deus por mim. Ele que é tão sensível à inocência irá escutá-la! Não creio que sua mãe se preocupe em atender a esse meu pedido, pois trocou os puros véus por louca atitude. (Beatriz d´Este, viúva de Nino; desposara em segundas núpcias a Galeano Visconti) Será infeliz na dor! Pois que se mortifique! Por ela facilmente se conhece como em uma mulher pouco permanece a chama do amor. Se o amor não estiver sendo alimentado freqüentemente pelo olhar da pessoa amada, esse fogo se extinguirá. A víbora que de Milão ostenta, (a víbora: o brasão da família Visconti) não ficará melhor no seu sepulcro, do que ficara o galo de Gulara”. Assim dizendo, Nino traduzia no semblante aquele zelo ardente e brando, que faz aquecer o coração.

Ainda tinha eu os olhos fixos no céu, no lado aonde o girar das estrelas parece mais lento, como na roda esse movimento está mais próximo do seu eixo, quando o Mestre me perguntou: “O que estás a olhar com tamanha atenção?” Respondi-lhe: “Aos três astros, verdadeiros portentos celestiais que iluminam todo o pólo”. E ele continuou: “As quatro fulgurantes estrelas que vimos pela manhã, se ocultaram; agora, surgem estas no mesmo lugar”.

Estava eu ainda a ouvir essas palavras, quando Sordello chama a atenção de Virgílio dizendo: “Eis o inimigo!” E o dedo acompanha o movimento dos olhos. Consegui ver na parte exposta do vale, uma serpente que se arrastava. Talvez a mesma que entregou a Eva a perigosa fruta. Avançava entre as flores e as ervas, virando a cabeça de um lado para o outro, com a enorme língua, esticada tentando lamber o dorso. Não pude ver como os celestiais pássaros se atiraram contra o abominável réptil, mas, atônito, pude vê-los pairando no ar. Sentindo o sussurrar que no ar as belas asas emitiam, rapidamente fugiu a serpente; em seguida os anjos voltaram ao lugar de onde vieram.

O espírito que estava ao lado do Juiz atendendo ao seu chamado e enquanto os anjos se retiravam me olhava atentamente, disse: “A divina luz que ilumina teus passos em direção ao alto, seja o alimento que sacia o desejo que tens de, a ele chegar; e para isso, não te falte a necessária sabedoria! Mas, se tiveste conhecido Val di Magra ou soubeste algo de novo a seu respeito, conta-me essas novidades pois, lá, obtive bens e poder. Fui Conrado Malaspina; não o antigo (o avô de Conrado, que teve o mesmo nome) mas seu descendente; o amor que sentia pelos meus, aqui mais purificado fica”. Respondi-lhe: “Ali não estive! Mas, em qual parte da Europa, a alta fama dos teus feitos não tenha tido repercussão imediata? A glória que teu brasão proclama, honra faz ao povo e ao lugar; mesmo aqueles que nunca o conheceram pessoalmente aplaudem seus valores. Juro que, se eu chegar a ver os esplendores celestiais, lá, aclamarei a honra da tua geração, por sua nobre índole e por seus atos, se resguardando da vaidade e adquirindo bens espirituais. Enquanto no mundo muitos governantes se desencaminham, teus descendentes seguem no bem e provam em fatos”. Disse-me ele: “Agora vai! Antes que o belo astro do dia percorra sete vezes esse espaço que a Constelação do Aires ocupa no firmamento, tua opinião sobre os meus descendentes será impressa na tua alma por acontecimentos, mais do que palavras, ditas a cada instante; se à vontade de Deus assim o permitir”.(Em 1.306, durante o exílio, Dante teve boa acolhida nos Castelos dos Malaspina, em Lunigiana.)

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

CANTO VII

Sordello, ao saber que aquele que abraçou é Virgílio, lhe faz novas e ainda maiores demonstrações de afeto. O sol está próximo ao ocaso e ao Purgatório não se pode subir à noite. Guiados por Sordello, os dois poetas param num vale, onde residem os espíritos de personagens que no mundo desfrutaram de grande consideração e que somente no fim da vida elevaram seu pensamento a Deus. Texto do Tradutor.
Ó glória dos latinos..."
Depois de doces e mútuas demonstrações de afeto, repetidas por três ou quatro vezes, Sordello se afastou dizendo: “Quem sois?”.

“Quando as primeiras almas chamadas por Deus à esperança do bem foram encaminhadas a este monte, já tinha Otávio (O imperador Augusto) sepultado meus ossos. Sou Virgílio; não fui afastado do Céu por pecados, mas por não haver conhecido a fé”.

Como quem vê diante de si algo maravilhoso e, ora crê ora duvida assim se perguntava essa alma: “Será verdade, ou minha vista me engana?” E curvando a fronte humildemente, se aproxima do Poeta; comovida abraça-lhe os joelhos e diz: “Ó glória dos latinos que a tamanhas alturas elevastes o nosso idioma! Honra eterna da amada pátria! Qual graça e ventura me concede ver-vos? Dizei-me, se digno sou de vos ouvir, de qual círculo do Inferno estais vindo?”

Virgílio responde: “Aqui estou subindo, após ter visitado todos os círculos do doloroso reino, sendo conduzido por virtude do Céu, Não por fazer, mas, por ter deixado de fazer sou proibido de ver o Sol que tanto desejas. Quando me foi Ele revelado, já era tarde demais! Lá embaixo existe um lugar onde não há martírios nem gemidos; há somente suspiros de solidão e desejo. Ali estou (no Limbo) no meio daquela gente inocente mordida pela morte, quando a culpa humana ainda não havia sido redimida. Estou entre os que, não tendo conhecido as três celestes virtudes, não afastaram a visão do mais suave encanto. (As três virtudes da teologia: fé, esperança e caridade ou amor.) Mas, conheces alguma vereda mais fácil, que nos leve até ao Purgatório?”

Respondeu: “Aqui não há um lugar determinado para a alma ficar; vou para qualquer parte que me agrade por isso poderei vos servir de guia. Mas, o dia já declina e na jornada que fazeis é proibido caminhar à noite. Busquemos, pois, algum lugar para a pousada. Ali à direita e um pouco mais distante a multidão está silenciosa e quieta. Se quiseres iremos até lá; talvez isso vos traga alegria”.

Então o Mestre respondeu: “Como? Pelo que dizes será impossível subir a não ser durante o dia? Ou te referes a alguém que não o permite?”.

Fazendo com o dedo uma linha no chão, disse Sordello: “Para além daqui não conseguiríeis passar, pois o sol se ausenta e a noite se inicia. Mas, se pretendeis continuar na caminhada, obstáculo algum encontrareis, a não ser a escuridão noturna. Se quiseres, podereis ir contornando a montanha enquanto o sol ainda não desapareceu completamente.”

Estranhando o que lhe foi dito, Virgílio pede: “Guia-nos, pois, ao lugar que recomendaste, por que a ansiedade já me domina”. Percebi que na montanha, um pouco adiante, havia uma depressão semelhante a que na terra formaria um vale. Disse-lhe a sombra: “Iremos até aonde a encosta forma uma curva”.

Entre a escarpa e o planalto, uma trilha inclinada nos conduz ao vale, onde mais ao meio a inclinação diminui. Olhando ao redor, vê-se entre um mar de folhas grandes e pequenas, límpidas e lustrosas como puras esmeraldas, uma diversidade imensa de ervas e flores das mais variadas cores, desde prata, branco, ouro refulgente, azul profundo, vermelho, cujos tons vinham do mais claro ao mais escuro; e juntando-se a esses tons de rara beleza, mil aromas suaves, se espalhavam pelo ar. E as almas, ali ocultas pelo vale sobre a relva e entre as flores, entoavam o “Salve, Rainha”.

Disse-nos, o mantuano que nos guiava: “Enquanto a luz do sol estiver presente, não devereis se aproximar da multidão; mas, do alto podereis reconhecer mais claramente suas feições e gestos do que estando mais perto. Observai aquele que ao alto aparece e, em silêncio escuta o canto dos demais; agora, mostra-se pesaroso por ter faltado com seus deveres; é o poderoso Rodolfo (Rodolfo de Habsburgo, imperador, governou de 1.273 a 1.291); podê-lo-ia ter evitado o mal que tanto prejuízo causou a Itália. Agora, quem lhe trará esperanças futuras? O outro que, com seu semblante parece querer confortá-lo e governou o reino onde nasce o Molta que despeja suas águas no Álbia e este lança suas águas no mar, é Otácar; (governou a Boêmia, onde nasce o rio Moldávia = Molta que desenboca no rio Elba = Albia). Desde a infância se mostrou de melhor índole do que seu filho Venceslau, o Barbudo, que governou na luxúria e na preguiça durante todo o tempo.(Otacar II, adversário de Rodolfo.) .

E continuou: “Aquele de nariz pequeno (Felipe III, da França, pai de Felipe ‘o belo’ e de Carlos de Valois) que parece estar conversando com o outro de aparência calma, ao fugir foi morto, deixando a flor-de-lis do seu escudo perder o brilho! Repara como ele bate no peito como que arrependido!...E naquele outro que lança profundos suspiros no ar, com a face apoiada sobre a mão; são o pai e o sogro do flagelo de França; conscientes do seu vergonhoso viver, agora estão sentindo tanta dor, que não descansam”. E indicando outros mais, disse: “Esse piedoso, de músculos volumosos, que acompanhado o cantar do que tem o nariz grande, (Pedro III de Aragão, que conquistou a Sicília e Carlos I de Anjour) foi zeloso em cultivar virtudes. Se o jovem que está sentado ao seu lado, o tivesse sucedido no trono, o valor de um Rei teria sido herdado por outro grande rei; mas os que tal trono herdaram, qual deles se preocupou com isso? Nem Jaime nem Frederico, ao herdarem o trono real, quiseram ficar com a melhor parte. Raramente tem surgido nas descendências das altas linhagens, alguém que dê valor ao dom das virtudes e, sequer solicita a Aquele que disse: pede e receberas. Tais palavras têm plena aplicação a esse, que tem o nariz grande, e a Pedro que ao seu lado canta, enquanto Apúlia e Provença, gemem e choram. (Os reinos de Provença e Nápolis, lamentam a morte de Carlos I pois estão sendo mal governados pelo seu sucessor Carlos II). É tão menor o filho se comparado ao pai, quanto Beatriz e Margarida são inferiores a Constança, quando exaltam as ações de seus esposos. (Tão inferior é Carlos II de Anjou a Carlos I, quanto este foi inferior a seu pai Pedro III). Ali podes ver, sentado à parte, o Rei de vida simples, Henrique da Inglaterra; em seu descendente, teve melhor sorte como seu sucessor. (Henrique III da Inglaterra teve um bom sucessor na pessoa de Eduardo I). Reparai também naquele que está mais abaixo, sentado e olhando para o céu; é o Marquês Guilherme, por quem Monferrato e Canavese choram, enquanto Alexandria lhes declara guerra”. (Guilherme, senhor de Monferato, cuja morte originou uma guerra desastrosa para os seus súditos).

quarta-feira, 11 de maio de 2011

O Purg. CANTO VI


Dante promete às almas que a ele se recomendam que não se esquecerá delas quando voltar ao mundo dos vivos. Os dois Poetas encontram o poeta Sordello, o qual, ao ouvir o nome da sua pátria Mântua abraça o mantuano Virgílio. Esse episódio move Dante a uma violenta invectiva contra as divisões e guerras internas que devastam a Itália.

Texto do Tradutor

"Agora vamos andar mais rápido"

Quando um jogo de zara (de dados) chega ao final, o que perde amargurado e solitário põe-se a ensaiar alguns lances que poderiam ter sido à seu favor. Os torcedores partem acompanhando o vencedor. Uns o cercam pela frente, outros o seguram por trás; os que estão ao lado pedem deles se lembrar; sem deter-se dá atenção a este e àquele; ao que lhe alcança a mão dela rápido se defende. Assim cercava-me a enorme multidão; ora a um, ora a outro me voltando, com promessas consegui me livrar de todos eles.

Ali estava o aretino que perdeu a vida por horrendo golpe aplicado por Ghin Tacco; (o juiz Benincasa – de Laterina – que foi assassinado pelo famoso bandoleiro Ghino del Facco) e também outro aretino que em perseguição ao inimigo se afogou. (Gercio Tarlati; morreu afogado no rio Arno, perseguindo os inimigos derrotados numa batalha). Rogando-me em sentida súplica, estava também Frederico Novello (morreu ao tentar socorrer Talati); e ainda, aquele pisano por quem seu pai Mazzucco, teve grande atitude. (Farinata degli Seornegiani, morto à traição. Seu pai Mazzuco, que se fizera frade, perdoou o assassino do filho.) Vi também o Conde Orso, (degli Albert, morto por seu primo) e aquele que sofreu terrível morte, não por ter alguma culpa, mas por ódio e inveja; (médico de Felipe III de França; enforcado sob falsas acusações); e o causador dessa morte que agora impera no Brabante (Pier della Broccia) se apresse em se penitenciar senão será levado a fazer companhia a maldita plebe, lá onde poderá sofrer terríveis suplícios.

Quando enfim pude me livrar daquela multidão aflita que suplicava preces para abreviar sua entrada na Celestial Mansão, perguntei ao meu Guia: “Em teu livro, ó douto Guia, afirmas textualmente que a oração não tem força bastante para modificar as disposições divinas; no entanto, essa multidão pede-as com ansiedade; seria vã sua esperança ou não pude compreender o que afirmavas?”

Respondeu-me: “Fui bastante claro na minha afirmação; e a esperança dessa gente não é inútil. A Justiça Divina não se modifica mesmo quando o pecador padecente é redimido por meio de fervorosas preces. Lá expus o pensamento afirmando que, por estar distante de Deus, aquele que suplicava nenhuma oração poderia ter valor. Porém, esse imenso problema para a inteligência, te será brilhantemente esclarecido. Por quem? Por Beatriz que risonha e feliz verás quando alcançares o cume desta montanha”.

Respondi: “Mestre, Agora vamos andar mais rápido; pois não sinto a menor fadiga como antes e já estou percebendo a sombra do cume da montanha”.

Continuou o Mestre: “É preciso prosseguir na caminhada, porém de acordo com nossas forças e enquanto tiver luz do dia; também não te enganes quanto aos teus desejos, pois as coisas não são tão fáceis como pensas. Antes de chegarmos ao cume, aguardarás a volta deste astro que está oculto agora pela encosta da montanha; seus raios ainda não desapareceram. Vê do outro lado aquele espírito solitário que atento nos aguardada; ele nos dirá qual o melhor caminho por onde devemos seguir”.

Chegamos. Ó nobre alma lombarda! Como se mostrava altiva e desdenhosa movimentando os olhos, grave e lentamente! Então, encarou-nos e, majestosa qual leão em seu repouso nos deixou aproximar, observando-nos em silêncio. Virgílio aproximou-se dela, pedindo que nos mostrasse a melhor subida. Ao invés de responder, perguntou qual foi a nossa pátria e a nossa vida. Meu Guia tinha começado a lhe responder: “Em Mântua...” quando aquela alma, comovida, de onde estava a ele se atirou dizendo: ”Sou Sordello e lá também nasci”. E os dois se abraçavam estreitamente. (Sordello de Visconti; poeta, jurisconsulto e guerreiro, do século XII).

Ah! Escravizada Itália, morada da aflição; nau sem comando em mar tenebroso; outrora rainha, agora transformada em prostituta. Esse espírito nobre e amável, somente ao escutar o nome da doce terra, logo ao patrício acolhe carinhoso enquanto os vivos, no teu solo, em sangrenta guerra, atiram-se ferozmente uns contra os outros aqueles que nascem e crescem entre os mesmos muros. Ó mísera Itália! Onde, em teu solo, poderá tua infeliz gente encontrar a paz? Cuidadosa, abriga-a sob teu manto aconchegando-a em teu seio. Em vão Justiniano veio te tomar as rédeas, pois tens ainda vazia a sela; maior vergonha te causou a tentativa de comando. (O Imperador Justiniano, que consolidou a legislação romana.) Ah! Cúria Romana! Cuida dos teus deveres religiosos e deixa o Imperador governar o país conforme decretou Cristo! Vê como a falta de domínio aguçou a fera dos maus instintos depois que mãos sem habilidade a está governando.

E tu, Alberto de Germânia, tão inteligente, mas, tão jovem que me causou espanto ter se tornado o sucessor do Imperador, reflitas agora, pois deverias tê-la governado antes de que tudo isso acontecesse! (Alberto l, filho do Imperador Rodolfo; eleito em 1.296). Justo castigo do Céu deverão tu e teu pai receberem por estarem ausentes em terra estranha por cobiça, enquanto permitem que o Jardim do Império esteja abandonado. Com indiferença, vês Capelleti e Montecchi (famílias de Verona) entristecidos, em tamanha aflição! Vês também, Monaldi e Filisppeche (famílas de Orvieto) alvos da própria fúria. Vem insensível! Vem ver teus fiéis seguidores oprimidos e procura amenizar seus sofrimentos! Vai até Santafiori (castelo e feudo imperial nas vizinhanças de Sena) para ver como eles estão sendo tratados! Vem ver tua Roma! Viúva e abandonada não se cansa de chorar e a todo instante clama: “Vem, César, vem! Não deixe minha esperança morrer!” Vem ver o amor que ainda existe no povo e se por nós não te move piedade, mova-te por zelo à tua fama! Se me é permitido perguntar, ó Supremo Deus sacrificado por amor aos homens, não Te comoves por nos ver sofrendo tanto ou, no abismo insondável da Tua sabedoria já está preparado para nós algum bem que nos é vedado conhecer? Um imenso tropel de tiranos subjuga muitas cidades da Itália e, qualquer (Cláudio Marcelo, adversário de Júlio César). dizendo-se inofensivo à pátria Ó minha Florença, esse episódio a ti não se refere, pois sempre ser um desses facínoras pode se tornar um Marcelo, viste de modelo a muitos povos. (Essas palavras de Dante, são de ironia contra sua terra natal) Enquanto muitos trazem na mente e no coração o desejo de vingança, aguardando para isso apenas a oportunidade, teu povo justiça a têm nos lábios permanentemente. Enquanto muitos não aceitam encargos públicos, teu povo solícito grita: “Estou pronto!” Alegra-te, pois o mundo reconhece em ti prudência, paz e riqueza! Digo a verdade e disso ninguém duvida. Atenas e Esparta que se elevaram às alturas por leis e instituições, viveram na incerteza; o que será de ti, ó Florença, que tens revogado em novembro, leis que foram aprovadas em outubro, e em curto período de tempo,foram transformadas leis, moedas, hábitos antigos e tradicionais, modificando até mesmo o temperamento e as atitudes de seu povo? Se vês com clareza, hás de te comparar a um enfermo que se agita no leito, procurando em vão aliviar e dor.

Não tem figura

sábado, 29 de janeiro de 2011

O Purg. CANTO V

Prosseguindo os dois Poetas a sua viagem, encontram uma multidão de almas que se aproximam deles, depois de ter percebido que Dante é vivo. São espíritos de pessoas que saíram da vida por morte violenta, mas no fim se arrependeram e perdoaram a seus inimigos.

Texto do Tradutor.

"Vejam! A luz do sol não atravessa..."

Acompanhando a sombra do meu Guia, já estava eu distante dessas almas quando uma delas apontando o dedo em minha direção gritou: “Vejam! A luz do Sol não atravessa o que vai mais devagar; ele se movimenta como se fosse vivo!”

Voltei-me em direção a aquela voz e admirado vi que as outras almas me olhavam cheias de espanto, por estar eu andando acompanhado de minha sombra. Disse-me o Mestre: “Por que, detém o passo, filho? Por acaso temes o murmurar desses espíritos? Segue-me sem dar atenção a essas vozes; seja como torre firme que, inabalável, se opõe à fúria dos ventos. Quem não firma o pensamento no que está executando, da finalidade se afasta, frustrando suas intenções”.Ao Mestre respondi prontamente: “Estou indo”. Respondi o que deveria responder, mas com o rubor a queimar-me as faces.

Seguíamos pelo atalho quando deparamos com uma multidão de espíritos que se dirigia ao cimo do monte entoando devotamente o Miserere, (Salmo de penitência que começa com essa palavra) mas, ao ver que meu corpo estava impedindo a passagem dos luminosos raios do Sol, suspendeu o canto, soltando um rouco “Oh!...” e dois deles como se fossem mensageiros, correram em nossa direção dizendo: “Quem sois que assim fazeis esta viagem?” Respondeu-lhes Virgílio: “Dizei aos que vos enviaram que, no corpo do homem que estais vendo, a vida permanece plena. Se, como imagino, estão vossos passos detendo por ver-lhe a sombra, a causa disso já vos foi explicada; sereis vós beneficiados, as honras lhe fazendo”.

Mais rápidos que as estrelas cadentes ou, a névoa da noite ser pelo sol desfeita, vão aqueles dois espíritos se juntar aos companheiros; em seguida, qual esquadrão em desfilada, todos correm em nossa direção. Então me disse o Guia em tom de alerta: “A imensa multidão vem ao nosso encontro; pretendem todos falar contido; escute-os, mas continues andando, pois não convém parar”.

E enquanto se aproximava a multidão gritava: “Ó feliz alma que no corpo em que nascestes vais à procura da celestial alegria, esperai um pouco. Vê se reconhece alguém dentre nós, a fim de levares notícias dele ao mundo; mas, por que andais assim tão depressa? Cruel perversidade tirou a vida, a todos nós; fomos pecadores até ao momento final da nossa existência, quando contritos e perdoando a quem nos tirou a vida. alcançamos a Divina Graça. Na paz de Deus estamos e aqui ficaremos; agora, o que nos aquece a alma é o desejo ardente, de vê-Lo”.

Respondi: “Vossas feições estão tão deformadas, que não consigo reconhecer ninguém. Mas, se posso ser útil em algo que vos agrade, pela paz que busco acompanhando esse sábio de mundo em mundo, a servir-vos me proponho, no mais breve espaço de tempo”.

E ele então respondeu: “Cada um de nós está confiando em ti; por isso, não se faz necessário teu juramento e, antecipando aos demais, rogo-te: se fores à terra que fica entre a Romanha e a que é propriedade de Carlos d´Anjou, procura meus parentes em Fano e suplica-lhes que, com piedosas orações ajudem a abreviar meu sofrimento e seja purificado de todo o mal que pratiquei. Nasci ali; mas os terríveis golpes que me cortaram a existência os recebi nos pântanos das terras de Antenor, lugar esse que eu julgava estar mais seguro. Assim o quis a ira do Marquês d’Este, que havia me preparado uma cilada. Ah! Se eu tivesse conseguido fugir para Mira, perto de Oriago, ainda hoje estaria no mundo onde se respira; mas, perseguido, correndo sem rumo certo no pântano cai ficando preso aos juncos, onde se formou um lago de sangue por causa do meu peito aberto”, (Quem fala é Jacopo Cassero, de Fano que, por ordem do Marquês Azzo III d’Este foi assassinado, quando se dirigia à Milão – em 1.298.)

Suplicou outro: “Se o desejo que te impulsiona para chegar ao alto monte for realizado, sê repleto de piedade por mim. Fui de Montefeltro e me chamava Buonconte; Ninguém se lembra de mim, nem mesmo Joana, minha esposa; por isso ando de cabeça baixa”.(Buonconte; filho de Guido capitão gibelino; – ver Inf. Canto XXVII – morreu na batalha de Campaldino) Perguntei-lhe: “Que má sorte te levou para tão longe de Campaldino, que ninguém sabe onde fica tua sepultura”? Respondeu: “Oh! Ao pé do Cosentino corre um rio que se chama Arcano; nasce sobre o Ermo, nos montes apeninos. Lá onde o rio perde seu nome, cheguei, fugindo a pé; minha garganta ferida ensangüentava o chão. Sentindo estar perdendo a visão e a voz, já no suspiro final bradei – “Maria!”- E o meu corpo tombou deixando a alma. Contarei a verdade, e ao mundo anuncias. Ao Anjo de Deus que viera recolher meu espírito, eu gritava: “Servo de Deus, me levas!”, e o do inferno bradava: “dele me roubas a alma por uma fingida lágrima mas, sobre o seu corpo cabe-me o governo”. Bem sabes que, quando a vaporosa umidade se acumula no ar e se encontra com o frio nas regiões elevadas, esse acumulo de unidade se transforma em chuva torrencial. O inimigo do bem então, da força infernal usando, com maldade planeja e o mal lhe obedece pois, as nuvens e o vento se acumulavam no firmamento. No final do dia no Potomagno o vale se envolve em trevas, enlutando a abobada celeste .Carregado o ar de pesadas nuvens as águas caem em tão forte chuva, tão intensa, que não se penetra na terra e em espumosa torrente se revolve. Veloz, alcança os leitos dos arroios e para o régio rio (o Arno) corre, destruindo os obstáculos que aparecem. Junto à foz meu cadáver encontrando, o impetuoso Arcano levanta-o e para o Arno o impele, separando-me os braços que eu deixara em forma de cruz sobre o peito; então o rio, rolando o meu corpo pelo fundo e pelas margens, deixou-o sepultado na areia, juntamente com o lodo e tudo quanto arrastara.”

Após breve silêncio, falou um terceiro espírito: “Ah! Quando tiveres retornado à luz do mundo e repousado da grande jornada, pensas em mim; sou Pia. Marema desfez o que Siena fizera. Bem o sabe aquele que me adornou, pondo-me no dedo seu anel de esposa, a mais preciosa das gemas”.(Pia Del Gastelloni, casada com importante membro da família Tolomei. Ficando viúva se casou com Nello Pannocchieschi que, desconfiado de sua fidelidade mandou-a matar, num castelo de Marema, em 1.295.)