O por quê da "Divina Comédia"

Desde criança sinto verdadeira atração pelas estrelas. Na fazenda de meu pai, - município de Itabuna – Bahia, não havia iluminação elétrica, por isso, enquanto meus irmãos sob a vigilância de meus pais brincavam como qualquer criança, eu, deitada sobre o gramado ficava a contar e descobrir novas estrelas. Achava lindo, o céu! O luar então me deslumbrava e ainda hoje me encanta. Meu pai, meu grande amigo, homem simples mas inteligente e culto, vendo meu interesse em conhecer os mistérios do Universo, me dava como presente tudo o que encontrava de interessante sobre o assunto, como mapas indicando a posição das estrelas e os nomes das constelações; e outros, dentre eles a “Divina Comédia”. Porém não conseguia ler seus versos; dizia que eram escritos “de trás para a frente”, mas sabia que Dante Alighieri tinha ido às estrelas. Então guardei o livro com muito carinho, pensando: quem sabe, um dia... Passaram-se 55 anos até que em Janeiro do ano 2.000, início do 3º milênio, me veio a inspiração: vou ler, e o que for compreendendo, vou escrevendo; tudo manuscrito. Meditei, conversei com Dante, pesquisei História Universal, Teologia, Religião, Mitologia, Astronomia... durante oito anos.
Agora, carinhosamente, quero compartilhar com vocês o resultado desse trabalho, que me fez crescer como mulher e espiritualmente. Espero que gostem.

domingo, 29 de abril de 2012

O Pug. CANTO XIII

Chegam os Poetas ao 2º compartimento no qual estão os pecadores que expiam o pecado da inveja. Os invejosos têm os olhos costurados com fio de arame. Entre eles está Sápia, senhora de Sena, com a qual Dante fala. Texto do Tradutor

"Fala com delicadeza e seja breve"

Havíamos chegado ao topo da escada onde novamente o monte apresentava estreita passagem por onde as almas sobem expiando seus pecados. uma parede de pedra circundava toda a colina, diferenciando da anterior apenas no tamanho que era menor. Não apresentava, como a outra, relevo de figuras ou forma. A escada sobre o declive se apresentava lisa, sendo a pedra de cor extremamente pálida.

Disse meu Mestre: “Não podemos esperar que apareça alguém para nos indicar o caminho; temo que demore muito a nos atender, e com isso nos atrasemos”. Depois, erguendo o olhar em direção ao Sol e firmando o corpo sobre o pé direito, voltou-se à esquerda dizendo: “Tu, a quem plenamente me entrego, conduz-nos ao caminho guiando-nos como exige esse lugar! Raiando, teu calor aquece o mundo; se não houver algo que impeça, não cesse o teu fulgor para assim nos conduzir!”.

Rápido, já havíamos vencido o espaço que na terra calculamos por milha, tanto o desejo estimulava nossos passos, quando sentimos voar em nossa direção invisíveis espíritos que, em suaves vozes convidavam para ir à mesa de amor. A primeira das vozes que passou por nós, disse claramenteVinum non habent”. (É a frase que Maria disse a Jesus para convencê-Lo a realizar o milagre da transformação da água em vinho.) e ainda bem distante foi repetindo; mas, antes de perder-se pelo ar em fora, aproximou-se outra voz dizendo “Sou Orestes (Orestes, para salvar Pilatos que fora condenado à morte, apresentou-se em seu lugar) e sem demora igualmente afastou-se. Então perguntei: “Que vozes são estas Mestre?” Mas, apenas pronunciara eu essas palavras, eis que surge uma terceira voz dizendo: “Amai aos vossos inimigos!” Disse-me o Mestre: “Este círculo pune a culpa traiçoeira da inveja, porém de maneira contrária, pelo amor e pela caridade. Antes que chegues ao portão que dá entrada ao perdão terás certeza disso pelos exemplos que aparecerão. Agora deverás manter o olhar voltado para adiante e então verás ao longo do alto muro de rocha, uma quantidade imensa de espíritos ali aguardando”.

Mas do que antes apuro então a vista e distingo almas envolvidas em mantos cuja cor imita a duro penhasco. Indo um pouco mais adiante, ouvi de muitos espíritos vozes que invocavam “Rogai por nós ó Maria, Pedro, Miguel e todos os demais Santos” (é uma prece.) Acredito que na terra, homem algum, por mais cruel que fosse não se comovesse ao ver o que meus olhos presenciaram. Aproximei-me procurando distinguir através de seus aspectos e gestos cada um daqueles espíritos; e, quando percebi qual o sofrimento que lhes causava tanta dor, não pude conter as lágrimas, pois claramente vi que todos, bem próximos à rocha se amparavam uns aos outros, naquele triste sofrimento.

É assim que mendigam os pobres cegos junto às portas das Igrejas nos dias do Perdão quando mutuamente se apoiando, atitude essa que comove os corações dos fiéis mais do que o som das palavras suplicando piedade. E como a luz do Sol aos cegos não se apresenta, assim também para aqueles espíritos a Luz do Céu não queria iluminar aqueles espíritos. Como ao gavião selvagem que para diminuir-lhe a condição bravia as pálpebras eram costuradas, todas aquelas almas tinham também as pálpebras costuradas com fino fio de arame.

Vendo-lhes as faces e a elas sendo impossível ver a minha, pensei que se eu andasse por entre elas procurando reconhecer alguém, seria verdadeiro ultraje; então olhei para o Mestre como se perguntasse qual deveria ser minha atitude; e ele sabendo o que convinha antecipou-se ao meu desejo dizendo: “Fala com delicadeza e seja breve!...” Virgílio caminhava pisando de leve, indo para o lado aonde ao portal de entrada faltava proteção. As almas estavam do lado oposto, mas bem próximas. Então observei seus olhos e vi a horrenda costura que lhes provocava copioso e amargo pranto.

Voltei-me a elas e disse: “Ó almas que tereis por certo a ventura de ver a Excelsa Luz e somente o vosso desejo vos trará a cura, que a graça Divina vos apague toda a mancha do pecado e faça brotar em vossas mentes o rio de límpidas águas. Assim, concedei-me o que mais desejo saber: se há entre vós alguém que tenha vindo da região italiana. Talvez possa eu reconhecê-lo”.

“Irmão, todos somos cidadãos de uma mesma Pátria; com isto quero dizer que, vivi na Itália, mas como peregrina”. A mim esta voz pareceu vir de bem distante por isso dela me aproximei para saber com certeza a quem deveria prestar atenção. Então vi entre outras uma senhora que distante me aguardava. Mas, como poderia eu reconhecê-la? Assim como faz o cego, dirigi meu pensamento naquela direção e perguntei: , se é tua a voz que há pouco respondia!”. E ela respondeu: “Tu que padeces no sofrimento aguardando a subida, quem fostes? Onde nasceste? Dizei-me, te imploro".

“Fui de Siena; com essas lágrimas suplico fervorosamente a Deus clemência e perdão pelos graves erros cometidos durante a vida terrena. Chamei-me Sápia (senhora senense, casada com Gninigal di Saraceni), mas não fui sábia; a infelicidade alheia me causava mais prazer, do que os inúmeros benefícios a mim própria concedidos. E para que não penses que te engano saberás o quão louca fui, pelo que vou te narrar. Já estava eu no declinar da existência, quando meus patrícios que estavam em combate contra o inimigo, acampavam. Roguei então a Deus que não os ajudasse. Derrotados puseram-se em fuga; e eu assistindo toda aquela desgraça exultava de alegria e, como que enlouquecida de felicidade, erguendo os olhos ao céu gritava: ‘Não preciso mais de Deus (Os senenses combatiam em Colle quando foram derrotados pelos florentinos. Sápia, que era inimiga do senhor de Sena, Provenzano Salvani, alegrou-se.) A partir daí, porém, não encontrei mais a felicidade. Tendo, no entanto, algum instante de tranqüilidade, já no fim da existência terrena quis encontrar a paz em Deus, mas não poderia minha alma pagar a enorme dívida se Píer Pettinagno (morreu com fama de santidade) em suas santas orações, movido por seu grande espírito de caridade, não houvesse se lembrado de mim. Mas, quem és tu que nos tens interrogado estando com os olhos abertos e com vida?”.

Respondi: "Também terei os olhos costurados, porém por curto tempo, pois já senti inveja embora levemente. Maior receio me fere o peito por outro tormento que conheci no primeiro círculo e isso me angustia tanto, que já começo a sentir seu peso".

E ela continuou: “Quem te guia a este monte, já que tens a certeza de voltar ao mundo dos vivos?“. Respondi: “Este que está ao meu lado em silêncio. Eu sou vivo ainda; fala pois com franqueza, alma eleita, se queres que lá na terra meus pés se movam com presteza em teu favor”. E ela respondeu: “O que estás dizendo, é maravilhoso, pois dá prova de predileção divina! Por isso Imploro-te me auxiliares, quando em tuas fervorosas orações. E também, pelo que te for mais precioso, suplico-te: quando pisares novamente a terra toscana e estiveres entre meus descendentes, desperta neles a estima ao meu nome. Irás encontrá-los entre a gente insana que em Telamone em vão se esforça, onde, igual ao que aconteceu anteriormente, buscava as águas do Diana, os almirantes irão nele se afundar”. (os senenses compraram Telamone, com a intenção de transformar essa cidade em porto de mar: mas isso não foi possível devido a salubridade do clima. Não tiveram êxito também na descoberta de um rio subterrânea que deveria passar debaixo de Siena e que chamariam Diana. Mais do que qualquer outros, os maiores enganados foram os almirantes.)

O Pug. CANTO XII

Os dois Poetas continuam a viagem. No pavimento do círculo estão pintados vários exemplos de soberba castigada. Um anjo vem para junto dos Poetas e os guia até a escada que sobe ao compartimento seguinte. Depois, com a asa apaga da testa de Dante um dos Ps. Texto do Tradutor.

“Ó humanidade! Foste criada para o céu!”

Íamos como dois bois unidos pelo jugo caminhando lado a lado, eu e aquela alma oprimida e de passos incertos, quando o Mestre falou: “Deixa de escutá-la e continua teu caminhar. Deve fazer das forças remos e velas, quem quer dar à barca impulso constante”.

Obedecendo a voz do Mestre ergui o corpo e comecei a andar embora minha mente continuasse presa na humildade e na modéstia. Apesar de cansado acelerei o passo e facilmente acompanhei Virgílio. Em se apressar, cada qual se mostra mais diligente.

Disse-me o Mestre: “Para mais rápido andar, olha para o chão e segue com teus passos aonde os meus pés pisarem”. Como nas sepulturas onde as lápides estão sobre a terra e as fisionomias dos mortos são nelas esculpidas a fim de manter vivas em nossa memória suas existências, assim, sobre aquela estrada que subia serpeando, viam-se muitas fisionomias esculpidas com a mais pura e sublime perfeição.

Via-se a mais bela e nobre das criaturas que expulsa do céu, E qual raio fulgurante foi arremessada pelo espaço. (Lúcifer, o mais belo dos anjos) Vi também Briareu transpassado por projétil celeste, gélido, estendido sobre o solo. (Briareu, gigante que se rebelou contra Júpiter e foi fulminado.) Estava também ali, abastecido de armas Marte, Palas e Timbreu; todos reunidos em torno de Júpiter (Apolo; que juntamente com Marte e Pelas, dominaram os gigantes rebeldes) a olhar o campo coberto por pedaços de corpos dos gigantes mortos. Vi Nemrod junto à imensa torre, em Sanaar olhando apavorado para seus companheiros que o seguiram e então não se compreendiam. (Que na planície de Senaar começou a construção da torre de Babel.) Ó Níobe, que a dor no olhar transparecia vendo seus filhos mortos quais cordeiros! (Tendo Níobe desprezado Latona por esta ter tido apenas dois filhos, enquanto ela tinha doze, foram todos os seus doze filhos mortos por Apolo e Diana, castigando-a assim.) Via-se Saul atingido pela própria espada, sobre a maldita montanha de Gilboé, onde a chuva e o orvalho não mais caiam. (Rei de Israel; derrotado em Gilboé, suicidou-se.) Ó louca Aracne, tua face aflita estava entre os destroços da teia de aranha, origem da fatal desdita. (Tendo desfiado Minerva para saber quem melhor tecia, foi por esta transformada em aranha.) Ó cruel Roboão! Tua imagem não mais ameaçava, pois apavorado fugiu da fúria popular (Filho de Salomão; oprimiu o povo de Israel durante o seu reinado e foi obrigado a fugir, em conseqüência da revolta popular). Mostrava ainda o duro pavimento, como Alcmeão fez com que a mãe pagasse caro pelo funesto adorno. (Alcmeon matou a própria mãe Erífiles, porque esta, para ganhar um colar de ouro, havia revelado o esconderijo do marido Anfiarau, aos inimigos.) Via-se também Senaquerib assassinado no templo por seus próprios filhos quando estes deveriam dar-lhe proteção (rei dos Assírios; foi morto pelos próprios filhos.) Ali aparecia também Ciro degolado e Tâmiris cheia de ódio dizendo “Tinhas sede de sangue, sê agora saciado!” (Tâmiris, rainha dos Massagetas; tendo vencido Ciro, o mandou afogar num barril cheio de sangue.) Aparecia ali também, a multidão de assírio que fugira ao ver a morte de Holofernes e o castigo que lhe seguira os passos. (General assírio morto por Judite durante o sítio da cidade de Betúlia.) Apresentava-se ali também a arrogante Tróia em ruínas e reduzida a pó. Ó soberba Ilion! A dura pedra mostrava tua lamentável sorte!

Que mestre no pincel ou no cinzel pudera traçar tais figuras, que pudesse atingir igual perfeição, deixando abismados os gênios nesta arte? Ali, a morte e a vida se apresentavam de forma real, aos meus olhos! Aqueles que participaram da própria cena não viram os fatos com mais realidade do que eu, enquanto estive a olhar aquelas imagens. Inclinem a fronte ó filhos de Eva, pois, estando cheios de orgulho, diante deste caminho encontrareis a punição!

Caminhávamos depressa subindo o monte, absorto contemplando aquelas imagens, sem perceber que o sol avançava no seu giro, quando aquele que com cuidado sempre me guiava, disse: “Ergue a cabeça e não te assuste! Ficas atento e repara naquele anjo que apressado vem ao nosso encontro; na terra já se encerra a sexta hora (meio-dia) de trabalho e recomeça outra. Com gestos e no olhar manifesta reverência, para que o anjo nos permita continuar na subida. Pouco falta para que termine o dia”

Aproveitar o benefício do tempo era do Mestre a regra, portanto não estranhei quando ele assim me falou. À nossa frente já se encontrava a bela criatura. Trajava branco; a face resplandecia tremulando qual estrela matutina. Abria os braços e estendia as asas dizendo: “Vinde! Os degraus já estão próximos e a jornada se tornará mais fácil. Certamente, são raros os que escutam essa voz. Ó humanidade! Foste criada para o céu! Por que então te deixas levar pelo simples sopro do mais leve vento?”

Fomos guiados para os degraus escavados na rocha. Com uma das asas, o anjo me roçou a fronte, prometendo-me venturosa subida. Como quem subindo ao monte de onde se avista o templo que se ergue ao pé do Rubaconte, percebe ser esse caminho formado por degraus talhado na rocha em tempo bem anterior aos livros de engenharia e medidas (Rubaconte: ponte na França), assim também onde eu estava, percebi ser este caminho formado por degraus que facilitavam a passagem de um círculo ao outro pelo rochedo que o circunda de todos os lados, fazendo com que este trajeto seja feito com suaves passos. Subindo os degraus, escutamos em agradável melodia, o canto do Beati pauperes spitirus”, com tão suave voz, que é impossível descrevê-la. Oh! Quão diferentes são esses círculos, daqueles infernais! Nesses, enquanto andamos ouvíamos suaves cantos! Naqueles, somente gritos de ira!

Quanto mais eu subia os degraus do monte santificado, mais leve me sentia. Para se chegar até onde estávamos a jornada nunca fora tão suave e fácil. Disse eu: “Ó Mestre, como me sinto leve, pois, mesmo caminhando rápido não me sinto cansado como antes”. Respondeu-me o Mestre: “Quando os PP que ainda tens em vivos traços sobre a fronte se apagarem, não haverá mais nada que te atrapalhe. Andarás por onde quiseres e o quanto desejar teus pés, mesmo assim não sentirás fadiga; ao contrário, até gozarás deleite, ao caminhares para as alturas”.

Como quem despreocupado estando a passear de repente passa a mão pela cabeça por se lembrar de alguma coisa, ou sente sobre a cabeça algo que lhe incomoda e, com a mão procura sentir o que a vista não enxerga, assim, estendendo os dedos sobre a fronte, reconheci surpreso que, das sete letras que o anjo abrira sobre minha fronte havia apenas seis. Então, o Mestre que me observava, sorriu

Não tem figura