O por quê da "Divina Comédia"

Desde criança sinto verdadeira atração pelas estrelas. Na fazenda de meu pai, - município de Itabuna – Bahia, não havia iluminação elétrica, por isso, enquanto meus irmãos sob a vigilância de meus pais brincavam como qualquer criança, eu, deitada sobre o gramado ficava a contar e descobrir novas estrelas. Achava lindo, o céu! O luar então me deslumbrava e ainda hoje me encanta. Meu pai, meu grande amigo, homem simples mas inteligente e culto, vendo meu interesse em conhecer os mistérios do Universo, me dava como presente tudo o que encontrava de interessante sobre o assunto, como mapas indicando a posição das estrelas e os nomes das constelações; e outros, dentre eles a “Divina Comédia”. Porém não conseguia ler seus versos; dizia que eram escritos “de trás para a frente”, mas sabia que Dante Alighieri tinha ido às estrelas. Então guardei o livro com muito carinho, pensando: quem sabe, um dia... Passaram-se 55 anos até que em Janeiro do ano 2.000, início do 3º milênio, me veio a inspiração: vou ler, e o que for compreendendo, vou escrevendo; tudo manuscrito. Meditei, conversei com Dante, pesquisei História Universal, Teologia, Religião, Mitologia, Astronomia... durante oito anos.
Agora, carinhosamente, quero compartilhar com vocês o resultado desse trabalho, que me fez crescer como mulher e espiritualmente. Espero que gostem.

domingo, 27 de setembro de 2009

O INF-CANTO I

 

O INFERNO– CANTO I

  PERDIDO NA SELVA ESCURA,

Dante anda errante durante toda à noite. Ao amanhecer começa a subir por uma colina, quando é impedido de passar pois a sua frente surge uma pantera, um leão e uma loba que o fazem voltar à selva. Aparece-lhe então a imagem de Virgílio que o reanima e se oferece a tirá-lo de lá. Texto do Tradutor

 Estando eu na metade da minha existência(aos 35 anos) tendo perdido a verdadeira estrada, encontrei-me no meio de uma selva tenebrosa (simboliza a selva dos vícios). Me ficaram cuidadosamente guardadas na memória as coisas horríveis que existiam no interior dessa cerrada e escabrosa selva. Na morte, há pouco mais de veracidade mas, para narrar com clareza o que me foi apresentado e outras que vi, farei com toda a verdade. Contar como lá entrei não posso pois um sono profundo me tomou os sentidos quando o bom caminho, abandonei. (O caminho da virtude)  
     
    Estava eu a vagar quando me encontrei ao pé de um monte onde  iniciava a selva que em escuro e profundo abismo continuava. Então um pavor imenso me invadiu! Olhei para o alto e vi a lua cuja claridade iluminava aquele monte e foi me orientando. Como um náufrago que mesmo já salvo mas, ainda medroso e ofegante olha as perigosas ondas com as quais lutara, meu espírito ainda tremendo ansioso voltou-se a olhar com atenção o espaço percorrido que homem vivo algum jamais atravessou ileso.
   
     Sentindo então ter repousado o corpo exausto segui subindo pela base da colina. Subia assim firmando bem o pé a cada passo. De repente surgiu ágil e rápida pantera cujo pelo tinha malhas matizadas. (A pantera é símbolo da luxúria e da fraude, principalmente em Florença). A fera parada me olhando firme não se afastava e, de tal modo impedia meu caminho que por vezes me fez querer voltar. No céu a aurora já resplandecia; subia o sol que se mantêm rodeado de astros desde quando o Amor Divino os criou. O movimento dos astros, a hora amena e o dorso alegre e mosqueado da fera, me infundiram na alma a esperança. Mas, de repente apareceu um leão de fronte erguida, com fome e raiva atroz que  novamente me encheu de pavor.  (leão – símbolo da avareza e da incontinência, principalmente da Cúria Romana). Aflito imaginei que fosse me atacar pois, com sua simples presença o ar parecia tremer.
    Depois  surgiu também uma loba esfomeada - mas saciada da repugnantes ambições, que é a causa da miséria de muitos homens. Movia o semblante com tão intensa ira que parecia querer entrar em minha mente enchendo-me de terror. Igual ao jogador que noite e dia perde e várias vezes joga sempre esperando ganhar, mas, ao contrário, novamente perdendo rebenta em prantos e se angustia, assim me fez sentir a fera que não sossegava. Enfrentando-me, ia aos poucos se aproximando, impelindo-me para traz.
 
 
     Enquanto eu tropeçava e escorregava em direção ao vale escuro de onde eu havia saído percebi alguém perto de mim, com voz muito fraca tentando falar-me e, assim que o ouvi naquele escuro deserto bradei esmorecido de medo: “Quem quer que sejas, sombra ou homem, tem compaixão de mim” (Era o poeta Virgílio Marone, símbolo da razão humana).
     “Homem não sou” – respondeu – “mas já fui. Tive pais lombardos ambos nascidos na amada cidade de Mântua.  Nasci ante de Júlio Cesar. (Caio Júlio Cesar. Líder militar e político romano que assumiu o comando em Roma). Vivi em Roma sob o governo do bom Augusto, quando ainda erradamente se adoravam falsos deuses. (Júlio Cesar Otaviano Augusto. Neto de Júlio Cesar. Foi o fundador do Império Romano e seu primeiro imperador). Como poeta decantei feitos do justo filho de Anquises, que conheci em Tróia e que, após a bela Ilion ter sido incendiada saiu de Tróia. Mas, qual o motivo de, repleto de tristeza, voltares a esse vale? Por que não retornas ao deleitoso monte que retém em si infinitos prazeres?”
       "Ó Virgílio!" - falei envergonhado a fronte curvando - "És tu, aquela fonte que como rio caudaloso brota a eloquência? Ó dos poetas lustre, honra, eminência! Valham-me o longo estudo e o amor profundo com que em teus livros procurei ciência. És meu Mestre, o sem igual; o único que me ensinaste o belo estilo o qual o mundo em ti tanto aprecia! Vês a fera que está impedindo o caminho; famoso sábio, socorre o perseguido que transtornado treme no pulso e nas veias!”    
     
Compadecendo-se do meu pranto Virgílio  respondeu: "De agora em diante te convém outro caminho para sair deste lugar selvagem. A fera que te faz bradar desesperado não vai te deixar passar impunemente; tem tão má índole e tão furiosa é, que jamais sacia o apetite e, mesmo empanturrada sente mais fome do que  antes. A  muitos  animais  ela se une e há de se unir até ser levada à horrenda

agonia pelo heroico galgo; herói esse que, mesmo sendo de origem humilde jamais será atraído por ouro ou poder e que terá por meta o saber, a virtude, o amor e será amparo forte da pobre Itália por quem Camila, a virgem, deu a vida e nela Turno, Euríalo e Niso encontraram a morte. Será implacável inimigo da fera perseguindo-a por todas as partes até lançá-la no infernal espaço donde foi pela inveja retirada.

Agora, para salvar-te tenho a intenção de te levar comigo; irei te guiando pela morada do eterno sofrimento. Ali verás almas em tortura tanta que, entre gritos estridentes, aos brados suplicam morrer novamente. Verás também outras em purificação, alegres apesar da dura prova das chamas, pois mantém a esperança de alçarem ao Paraíso. Se queres subir até lá, um ditoso espírito te servirá de guia quando te deixar à porta do Glorioso Reino. (É Beatriz; a mulher que Dante muito amou). O Rei do Céu não consente que eu veja a glória da Sua cidade, pois estou sendo castigado pela minha rebeldia à Sua lei; em toda a parte Ele governa onipotente! Mas tem no Empíreo Sua augusta sede; por Ele, o eleito à glória se sente imensamente feliz".

 "Poeta" - disse eu - "por esse Deus que jamais conheceste, rogo-te que eu seja afastado deste e de outro mal maior; que eu vá contigo até a Porta de São Pedro (a porta onde São Pedro é o chaveiro) onde disseste seria eu conduzido e veja os maus a quem se houveste referido."

Moveu-se então o Poeta e eu o segui.

 


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