O por quê da "Divina Comédia"

Desde criança sinto verdadeira atração pelas estrelas. Na fazenda de meu pai, - município de Itabuna – Bahia, não havia iluminação elétrica, por isso, enquanto meus irmãos sob a vigilância de meus pais brincavam como qualquer criança, eu, deitada sobre o gramado ficava a contar e descobrir novas estrelas. Achava lindo, o céu! O luar então me deslumbrava e ainda hoje me encanta. Meu pai, meu grande amigo, homem simples mas inteligente e culto, vendo meu interesse em conhecer os mistérios do Universo, me dava como presente tudo o que encontrava de interessante sobre o assunto, como mapas indicando a posição das estrelas e os nomes das constelações; e outros, dentre eles a “Divina Comédia”. Porém não conseguia ler seus versos; dizia que eram escritos “de trás para a frente”, mas sabia que Dante Alighieri tinha ido às estrelas. Então guardei o livro com muito carinho, pensando: quem sabe, um dia... Passaram-se 55 anos até que em Janeiro do ano 2.000, início do 3º milênio, me veio a inspiração: vou ler, e o que for compreendendo, vou escrevendo; tudo manuscrito. Meditei, conversei com Dante, pesquisei História Universal, Teologia, Religião, Mitologia, Astronomia... durante oito anos.
Agora, carinhosamente, quero compartilhar com vocês o resultado desse trabalho, que me fez crescer como mulher e espiritualmente. Espero que gostem.

sábado, 21 de novembro de 2009

O INF. - CANTO XX

No quarto compartimento os impostores que se dedicaram à arte divinatória (Magia).Eles têm os rostos e o pescoço voltados para as costas, pelo que são obrigados a caminhar a reverso. Virgílio mostra a Dante alguns, entre os mais famosos está a tebana Manto, da qual se origina Mântua, cidade natal de Virgílio.
Texto do tradutor


"És também insensato?..."
Como matéria ao meu vigésimo canto devo narrar, como são punidos os farsantes e outros ímpios, que se dedicam à arte de enganar.
Estava eu disposto a fazer qualquer esforço para ver o que se passava naquele abismo de onde se escutava amargo pranto. Vi ao longo daquela terrível cova, multidão de almas, tristes e lacrimosas andando a passos lentos, como aqui na Terra se anda em procissão.
Olhando mais a baixo, percebi que, de modo espantoso, todos os condenados dali tinham, o pescoço e a cabeça voltados para trás, mas caminhavam seguindo a direção dos pés. Olhar, para frente não podiam. Somente por força de paralisia, pudesse haver alguém assim com o corpo retorcido mas, é difícil acreditar que haja. A Deus provesse, caro Leitor, que te fosse útil esta lição! Pensas com carinho, como cresceu em mim a compaixão, vendo infelizes naquela terrível situação; choravam e, o pranto que dos olhos lhes saia, descia pelas costas e rolava pelas nádegas.
Apoiado no rochedo eu chorava tão profundamente, vendo aquela dor, que o Mestre, me repreendeu dizendo. “És também insensato? Aqui não há lugar para piedade. Que ternura sente Deus por eles, se os condenou a tamanha tortura? Ergue pois, a fronte e repara naquele condenado que se atirou no abismo, perante os tebenos, quando lhe gritavam: “Para aonde estás correndo, Anfiarau; isso são modos de se deixar o campo de batalha?” (Anfiarau, que morreu no sítio de Tebas quando, prevendo a sua morte, tentara esquivar-se de tomar parte nessa batalha). No entanto, ele penetrava no vale onde Minos, a todos atormenta. Querendo adivinhar o futuro, tem a frente voltada para as costas e, a recuar caminha, olhando somente o que ficou para trás. Eis ali Terésias, o que mudou de aspecto, tomando forma e feições femininas, sendo-lhe o que era varonil, desfeito. (Adivinho tebano que foi transformado em mulher, e depois, transformou-se novamente em homem.) Voltou a se tornar novamente homem quando, encontrando duas serpentes unidas entre si, com um golpe de bordão, as separou, tornando-as perfeitas. Ali está Arons, (adivinho lembrado na “Fardália” de Luciano.) que tem o ventre voltado para as costas; no monte Lunos, de onde se vê Carrara, teve sua permanente residência em gruta de mármore, de onde podia consultar livremente os astros e o mar. Essa mulher ali – continuou meu Guia – que, com suas fartas e longas tranças oculta os seios e tem a pele protegida por pêlos, foi Manto, (filha de Terésias que a tradição diz ter fundado a cidade natal de Virgílio – Mântua.) que andou errante e incerta por muitos lugares e, somente encontrou repouso na terra aonde nasci. Do que estou me referindo, falarei mais um pouco. Vendo que seu pai já havia se despedido da vida e que a cidade de Baco, (Tebas) estava sendo tristemente subjugada, saiu a vagar pelo mundo por longo tempo. Na bela Itália, nos Alpes junto ao Tirol, já perto da Alemanha, existe um lago chamado Benaco. Canal de fontes mil que banha a região entre os montes Garda, Carmônica e Apeninos, com habilidade, conduz suas águas em grande quantidade, formando esse imenso lago. (hoje, largo de Garda). No meio do lago, há uma ilha em que o Pastor trentino e com ele, os bispos de Bréscia e de Verona dizem, transmitir bênçãos divinas. Onde em Benaco a região é mais baixa e faz fronteira com Bréscia e Bergamo, forte trincheira se eleva altiva, resguardando as armações de pesca. Nas enchentes, quando o lago não consegue reter suas águas, dali elas escorrem formando um grande rio, que encobre fartamente os prados; esse rio, mesmo não sendo permanente, recebe o nome de Múncio e, com esse nome continua, até unir-se ao rio Pó, que deságua no mar. Ao se aproximar o verão e, tendo ainda toda a planície se transformado em pântano, esse lugar representa grande perigo à saúde dos habitantes da região.
“Manto, a virgem errante, ali passando, viu esse lugar desabitado e árido cercado por aquele pantanal. Esquiva ao convívio humano, fez dali, a oficina de suas artes mágicas até ser levada pela morte. Desde então, o povo para ali se volta espalhando-se ao redor do lago, julgando ser aquele lugar abrigo seguro e forte por estar ele, cercado por águas e pântanos; mas, os que ali escolheram para viver, encontraram a morte. Com o passar dos tempos surgiu a cidade de Mântua, assim chamada em homenagem ao seu nome. Seus habitantes de multiplicaram tornando-a assim uma das cidades mais povoadas, antes das intrigas astuciosas entre Pinamonte e Casalodi”. (Pinamonti dei Bonacolsi, para apoderar-se de Mântua, induziu o governador Alberto de Casalodi a praticar atos violentos contra o povo, que se revoltou contra eles.) E continuou. “Ficas pois ciente: se alguém quiser afirmar que a minha pátria teve origem em outra fonte, não permitas que a verdade seja substituída pela mentira”.
Então disse eu: “As coisas que tua voz revela, para mim são tão verdadeiras que, tudo que outros me disserem, para mim é carvão extinto. Mas, diz-me ó Mestre, desses condenados que se aproximam, há algum que mereça atenção?”. Respondeu-me: “Esse cuja barba desce pelas costas, foi adivinho; quando a Grécia sofreu grande derrota, espalhou boatos infames ao dizer que na Grécia havia homens somente nos berços. Em Áulide, Calcas (outro adivinho da Antigüidade) vaticinara, indicando o tempo em a primeira frota deveria partir. Em Eurípilo (outro) um dos meus versos, essa história é narrada; bem o conheces, pois em tua mente ainda guardas. Aquele tão magro que próximo a nós está, foi Miguel Escotto (célebre adivinho do tempo de Frederico II) que era perito nas fraudes da magia. Olha ali Guido Bonati! (astrólogo do conde de Montefeltro) Veja também Asdente (sapateiro e adivinho em Parma) que deveria cuidar apenas da sovela; agora, arrepende-se inutilmente de ter desprezado a agulha, para se dedicar a terrível arte de encantos infernais; ai vem se aproximando as que se dedicaram ao curandeirismo; agora estão diante dos mesmos, que antes as achavam encantadoras”.
“Mas, vamos andando; no centro, onde se divide o hemisfério, está Caim com seu fardo e, em Sevilha, o mar já está além da fortaleza. (Caim: a lua; no tempo de Dante, acreditava-se que as manchas existentes na lua eram, a imagem de Caim carregando um feixe de espinhos.) A lua, sua face plena está mostrando! Lembras-te!? Ontem a viste na sombria selva, onde te ajudou seu brando fulgor”.
Enquanto o Mestre assim falava, ia eu seguindo seus passos no mesmo ritmo.
Nota: Não tem figura

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