O por quê da "Divina Comédia"

Desde criança sinto verdadeira atração pelas estrelas. Na fazenda de meu pai, - município de Itabuna – Bahia, não havia iluminação elétrica, por isso, enquanto meus irmãos sob a vigilância de meus pais brincavam como qualquer criança, eu, deitada sobre o gramado ficava a contar e descobrir novas estrelas. Achava lindo, o céu! O luar então me deslumbrava e ainda hoje me encanta. Meu pai, meu grande amigo, homem simples mas inteligente e culto, vendo meu interesse em conhecer os mistérios do Universo, me dava como presente tudo o que encontrava de interessante sobre o assunto, como mapas indicando a posição das estrelas e os nomes das constelações; e outros, dentre eles a “Divina Comédia”. Porém não conseguia ler seus versos; dizia que eram escritos “de trás para a frente”, mas sabia que Dante Alighieri tinha ido às estrelas. Então guardei o livro com muito carinho, pensando: quem sabe, um dia... Passaram-se 55 anos até que em Janeiro do ano 2.000, início do 3º milênio, me veio a inspiração: vou ler, e o que for compreendendo, vou escrevendo; tudo manuscrito. Meditei, conversei com Dante, pesquisei História Universal, Teologia, Religião, Mitologia, Astronomia... durante oito anos.
Agora, carinhosamente, quero compartilhar com vocês o resultado desse trabalho, que me fez crescer como mulher e espiritualmente. Espero que gostem.

domingo, 29 de setembro de 2024

 

O PARAÍSO -- CANTO IX

  “CALA-TE! DEIXA OS ANOS SE PASSAREM!”

Depois de Carlos Martel, fala com Dante Cunizza de Romano, irmã do tirano Ezzelino. Prediz-lhe iminentes desventuras na Marca de Treviso e de Pádua, e uma negra traição do bispo de Feltre Folco de Marselha manifesta-se a Dante e lhe indica a alma resplandecente de Raab que favoreceu os hebreus, na conquista da Terra Santa. Fala com austeridade contra Florença e contra a Cúria Romana. Texto do Tradutor.

Ainda no 3º céu- em Vênus

Depois de Carlos ter com bondade esclarecido várias dúvidas falando-me sobre as traições e enganos que atingiram sua descendência, para encerrar o assunto disse-me: “Cala-te! Deixa os anos se passarem!” E aquele iluminado espírito voltou-se novamente para o Sol que de júbilos o enchia.

Agora posso somente dizer que justo pranto virá em seguida aos vossos danos. Ó iludidos mortais! Raça impiedosa que mergulhando em vãos pensamentos os corações desvia do Supremo Bem!

Depois vi outro clarão se encaminhando em minha direção cuja luminosidade aumentando indicava sua alegria em satisfazer-me também. Beatriz como anteriormente fez em mim fitava o olhar e em seu grandioso gesto indicava que eu deveria me manifestar; então exclamei: “Ó bendito ser que com presteza a mim se dirige, o aumento de tua luminosidade indica saberes o que agora penso; dá-me a prova disso satisfazendo meu desejo”. Então o intenso clarão que vi descendo das alturas a cantar, disse:

“Naquela parte da Itália oprimida e escravizada que fica situada entre o Rialto, as nascentes do Brenta e do Piave (província da Marca de Trevisana) vê-se uma colina de pequena elevação. (Colina onde está situado o castelo da família de Ezzelino da Romano). Lá baixou a fagulha que se transformou em grande incêndio e se espalhou por toda a região. (A fagulha é Ezzelino II da Romano que governou a região com grande crueldade). Pertencemos à mesma família. Chamei-me Cunizza (irmã de Ezzelino III, mulher de fama duvidosa pela sua vida livre; morreu em Florença onde talvez tenha se penitenciado); e se neste planeta agora resplandeço (no Planeta Vênus) é porque me  venceu Vênus que comanda o amor. Não sinto vergonha da vida que tive; alegremente me penitenciei. Minha atitude talvez tenha causado estranheza ao povo. A luz refulgente que está ao meu lado, amada joia deste nosso planeta, sua fama foi grande e continuará e crescer permanecendo no tempo por cinco séculos    (amada Joia - é a alma de Folco de Marselha, trovador e poeta  que se manifesta a Dante e lhe indica a alma resplandecente de Raab, que favoreceu os hebreus). Dizem com razão: - ‘Se o homem aspira à glória, quando a vida terrena se extingue  uma outra vida o espera: a eterna!’– porém este fim não terá o povo que habita entre o Ádige e o Tagliamento (os habitantes da Marca Trevisana) nem a desgraça os afastará dos seus erros. Em breve o povo de Pádua tingirá de sangue as águas que banham os alicerces de Vicência. (Os paduanos iriam sofrer uma sangrenta derrota contra seu inimigo Cangrande della Scala) Lá onde o Cagnan e o Sile se unem se prepara o laço que fará cativo aquele que está no poder  mostrando ser grande soberbo. (Ricardo de Camino senhor de Treviso foi morto traiçoeiramente pelos seus inimigos). Feltro há de chorar em consequência da negra traição praticada por seu ímpio Pastor  (Alexandre  Novello, bispo de Feltro; entregou ao Papa  vários gibelinos de Ferrara que foram levados a Prisão de Malta e condenados à morte); o maior criminoso que Malta conheceu. De enormes dimensões teria de ser o tonel que recebesse o sangue desses ferrarenses; e o esforço humano jamais poderia pesá-lo; e todo esse derramamento de sangue causado por um maldoso pastor em prol  do seu partido político! A maldade daquela terra sua índole explica. No mais alto dos céus existem espelhos celestiais chamados de Tronos que refletem em nós a vontade Divina; o que eu profetizo agora é manifestação de Sua vontade; portanto deves acreditar nos fatos agora revelados”(foi o que aconteceu: Cangrande della Scala derrotou os paduanos em sangrenta batalha).

Calando-se, Cunizza indicava que sua atenção havia se voltado  para outros cuidados e assim retornou ao círculo de onde viera. Aquele de quem Cunizza havia falado, resplendecendo extraordinariamente qual rubi que ao sol flameja à mim se mostrou (Cunizza havia falado de Folco que reluzia ao seu lado). Seu intenso brilho indicava alegria como a nossa é manifestada pelo riso e no inferno os gestos tristes indicam sofrimento. Então falei: “Deus tudo vê e Nele teu olhar se ilumina ditoso espírito; por isso todos os desejos são do teu conhecimento. Porque com tua voz que encanta o Céu e faz parceira no canto dos anjos que possuem seis azas e têm resplandecentes as vestes não sacia em mim a sede de ouvir-te! Se em ti eu visse o desejo de me ouvir como tenho a certeza de que estás percebendo em mim, te falaria sem esperar que me pedisse”.

Deste modo ele então começou a me responder: “O maior dos vales por água inundados, excluindo o mar que rodeia toda a Terra, está entre as opostas regiões que ficam em direção contrária ao Sol; tão opostas são que ao meio-dia a linha do horizonte parece exatamente igual para quem está na parte oriental ou ocidental da região. Nasci próximo desse extenso vale, entre o Ebro e o Magra onde faz divisa com Toscana e Gênova.  (Em Marselha - França, onde Folco nasceu, viveu e morreu) Quase meio dia de viagem se leva de Bugia ao meu querido lar; o sangue dos meus antepassados avermelhou seu porto (Porto de Marselha). Chamei-me Folco e assim fui conhecido. Agora este Céu está repleto da minha luz como quando na Terra eu estava e resplandecia de amores. Afirmo-lhe que Dido - que ciúmes causou a Creusa e a Siqueu, não conheceu amor ardente mais do que eu, enquanto a idade me permitia (Dido: rainha de Cartago; amando Eneias ofendeu a Cleusa, mulher de Eneias, e ao próprio marido Siqueu); nem a infeliz Rodopea que foi abandonada por Demofonte; nem outrora Hércules quando a Iole o coração oferecera. (Iole amante de Hércules, que por ciúme foi morta por Dejanira). Aqui não existe remorso; sentimos alegria não pela culpa ao amor humano já está esquecida, mas pelo Amor Divino cuja lei é adorada. Aqui se contempla a criação que, grandiosa, intensamente brilha; e a Suprema Vontade se evidencia na influência que o firmamento exerce sobre a Terra. Para que teus desejos sejam completamente satisfeitos, parte do meu discurso ainda continua.

“Agora queres saber quem é a luz que resplandece como o sol quando na água se reflete? Aquela que vês ali alegre e tranquila  é Raab; (meretriz de Jericó; escondeu os espiões que Josué havia mandado a Jericó, facilitando a queda da cidade e, por isso, foi salva da morte, depois da vitória dos hebreus: [Bíblia – Josué 2, 1 – 24). Está agora reunida ao nosso grupo e intensamente brilha neste céu onde a ponta da sombra projetada pela terra alcança. (Segundo Ptolomeu, a sombra da terra se projeta até o limite de Vênus.) Foi ela a primeira a ser recebida por Jesus Cristo triunfante. Devia dar-lhe um paraíso com prêmio quando bem quisesse após a vitória imensa conquistada pela cruz, pois foi por intermédio dela que começou a glória que colheu Josué na Terra Santa e que se apagou da memória do Papa. (O Papa não se interessa pela Terra Santa, que está sob o domínio dos Sarracenos). Tua pátria que teve origem na semente daquele que ao Criador foi o primeiro rebelde, (Florença teve origem demoníaca) pela inveja que tanta aflição causou, tem produzido amaldiçoada flor que corrompendo, faz o pastor transformado em lobo conduzir ovelhas e cordeiros. Nas páginas das Decretais já gastas pelo excesso de uso, (os livros das leis canônicas, que asseguravam vantagens aos eclesiásticos) Papa e Cardeais nelas prendem a sua atenção abandonando o Evangelho e tendo as ideias nisto mergulhadas esquecendo Nazaré que viu abertas as azas do Arcanjo Gabriel.

“Mas o Vaticano e os lugares que a Roma enobrecem e tem sido o local de repouso dos fiéis seguidores de Pedro, lhe obedecem e em breve estarão livres da traição”.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário