O por quê da "Divina Comédia"

Desde criança sinto verdadeira atração pelas estrelas. Na fazenda de meu pai, - município de Itabuna – Bahia, não havia iluminação elétrica, por isso, enquanto meus irmãos sob a vigilância de meus pais brincavam como qualquer criança, eu, deitada sobre o gramado ficava a contar e descobrir novas estrelas. Achava lindo, o céu! O luar então me deslumbrava e ainda hoje me encanta. Meu pai, meu grande amigo, homem simples mas inteligente e culto, vendo meu interesse em conhecer os mistérios do Universo, me dava como presente tudo o que encontrava de interessante sobre o assunto, como mapas indicando a posição das estrelas e os nomes das constelações; e outros, dentre eles a “Divina Comédia”. Porém não conseguia ler seus versos; dizia que eram escritos “de trás para a frente”, mas sabia que Dante Alighieri tinha ido às estrelas. Então guardei o livro com muito carinho, pensando: quem sabe, um dia... Passaram-se 55 anos até que em Janeiro do ano 2.000, início do 3º milênio, me veio a inspiração: vou ler, e o que for compreendendo, vou escrevendo; tudo manuscrito. Meditei, conversei com Dante, pesquisei História Universal, Teologia, Religião, Mitologia, Astronomia... durante oito anos.
Agora, carinhosamente, quero compartilhar com vocês o resultado desse trabalho, que me fez crescer como mulher e espiritualmente. Espero que gostem.

domingo, 25 de abril de 2010

O INF - CANTO XXVII

Outro danado entra a falar com Dante. É Guido de Montefeltro, o qual pode notícias de Romanha sua terra natal. Conta depois, que foi condenado por causa de um mau conselho que fiado na prévia absolvição, dera ao Papa Bonifácio VIII.
Texto do Tradutor
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A chama que se erguera, quieta estava.
Não mais falando já se retirava com a permissão do gentil Poeta; então outra que se aproximava, emitindo confusos sons que saiam pela ponta da chama nos fez ver que oscilava, querendo se comunicar.
Igual ao touro siciliano cujo primeiro mugido foi produzido pelo sofrimento de seu inventor que recebendo como prêmio, o pranto que derramou, (Mitologia: Perilo, para agradar Falarides, - tirano de Agrigento - construiu um touro de bronze, dentro do qual seriam colocados os inimigos do governador; sendo o bronze aquecido, os gritos de dor dos condenados, seriam iguais aos urros do animal. Falarides quis experimentar o invento, usando para isso, o próprio inventor: Perilo) assim a voz do miserando ecoou em dor tão pungente como se estivesse sofrendo em vida. Assim o estalar das chamas em som lastimoso se transformava mas não nos alcançava em forma de palavras; então, com muito esforço conseguiu manter-se em equilíbrio; e em movimento, a língua do condenado apareceu falando: “Ó tu, a quem me dirijo, e há poucos instantes dizias em idioma Lombardo, “Podes ir, porque já me respondeste”, apesar de ter eu chegado um pouco atrasado, não me negues a tua atenção; primeiramente quero dizer que não sinto nenhum prazer em vê-lo aqui. Se acabas de chegar a este abismo tenebroso, saudoso deves estar da sua terra latina onde tantos pecados cometeste, em tempos passados. Mesmo assim, dizei-me: os Romenos estão em paz ou em guerra, pois eu fui de lá dos montes, entre Urbino e a altiva montanha que origem dá ao Tibre”. (Quem fala é Guido de Montefeltro que, após ter sido valoroso guerreiro, tornou-se franciscano.)
Atento eu o escutava; então meu Guia tocando-me no ombro, diz: “Agora podes falar, por que este é italiano”. Eu que já tinha a resposta pronta, voltei-me ao pecador dizendo: “Ó alma, que o fogo assim te reveste e te martiriza, tua Romanha, - no modo de pensar dos tiranos que a oprimem, - está sempre preparada para a guerra. Porém, em nenhuma, está ela agora, envolvida. Em Ravena, a longo tempo a forte águia de Polenta ali se aninha; com suas largas asas cobre também toda a Cérvia. (A família de Polenta, que tinha como emblema, uma águia, dominou por muito tempo, Ravena e Cérvia.) A terra que tardiamente havia procurado se defender, (Forli,) sofre ainda sob o jugo do Leão Verde que a inundou de sangue. (Leão Verde – Sinibaldo Ordelaffi, que tiranizou a cidade de Forli.) Dos mastins de Verruchio, (Malatesta e Malatestino de Verruchio, senhores de Ramini.) a subjugada gente sentia ainda os cruéis dentes, até que a Montagna deram desapiedada morte. (Montagna, prisioneiro gelfo, que Malestino mandou matar.) As cidades que são banhadas pelo rio Lemone e pelo rio Saterno, (as cidades de Faenza e Ímola), estão sendo governadas pelo “Leão de Alvo Leito”, que a cada inverno muda de partido, Outra cidade, a que é banhada de pelo rio Sávio e está situada montanhas e planície, (Casena) ora vive em liberdade, ora sob o jugo vai sofrendo. Agora, sê condescendente conosco, como temos sido contigo, diga-nos quem foste e se no mundo teu nome é muito conhecido”.
Comovido, agitando-se de um lado para o outro a aguda ponta de fogo murmurou: depois, soltando a voz, assim falou: “Se eu tivesse que dar essa resposta a quem estando aqui, à luz do mundo voltasse, quieta ficaria minha aflita língua. Mas, como certo é que, quem ao inferno cai dele jamais retorna, não há medo que me impeça de falar. Primeiro fui guerreiro e depois franciscano acreditando ser a vida, no convento, fosse um meio certo de evitar o mal; e assim teria sido não fosse o Papa - a quem tudo de ruim, desejo que aconteça! - ter-me induzido a praticar o mal, (O Papa Bonifácio VIII.) Enquanto eu estava vivo sobre a terra, não me tornei um leão por meus feitos, mas abalizada raposa por minhas astúcias. Estratégias sutis, ardis perfeitos tanto armei, que meu nome se tornou conhecido por toda parte.” Parando de falar por alguns segundos, continuou:
“Durante a existência, muito erra quem, estando com seu navio em perigo e encontrando um porto de salvação não recolhe os cabos, nem baixa as velas. Por isso, deixando as coisas que mais amava, me humilhei confesso e arrependido. Mas, ai, de mim!... Certamente o perdão teria alcançado... Mas o Príncipe infiel, o chefe dos novos fariseus, lá de Latrão declararou cruenta guerra não contra mouros ou judeus descrentes, mas contra os cristãos. (Os Colonenses moravam perto da Igreja de São João, em Latrão.) Nenhum deles havia cometido crimes como invadir o Acre ou praticar negócios fraudulentos com o Sultão. Nesse momento, não considerou em si as Sagradas Ordens nem o excelso cargo que ocupava, muito menos viu em mim o humilde cordão franciscano que símbolo é de penitência. Como fez Constantino que foi a Sirati pedir a Silvestre para o curasse da lepra, (conta uma lenda que, Constantino foi curado da lepra por São Silvestre, que morava numa gruta do monte Soracte) assim fez ele; (Bonifácio VIII) procurou em meus conselhos remédio para a cura do seu febril orgulho. Hesitante, calei-me percebi em suas palavras verdadeira loucura!
“Fala!”– insistiu – “Não tenhas receio; desde já estarás perdoado de todos os teus pecados se me ensinares como vencer, ardilosamente, a Palestina”. (Para onde os Colonenses se haviam retirado). Continuando eu em silêncio, ele insistiu: “Eu abro e fecho as portas do Céu; as Duas Chaves me dão esse puder divino que foi rejeitado por meu antecessor”. (Clemente V). Abalado diante de tão grave situação, respondi: “Santo Padre, se do pecado que agora vou cometer estás antecipadamente me perdoando, terás, na tua Cadeira Pontifícia, honras e glória prometendo muito e cumprindo pouco”.
“Quando morri, São Francisco veio buscar minha alma; mas, prontamente surgiu um demônio gritando: - “Não o leves, porque assim me parece injusto! O lugar dele já está preparado entre os meus. Desde o momento que seu conselho foi pronunciado, tenho-o preso pelos cabelos. Perdão só recebe, quem arrependido chora; não se pode sentir o arrependimento e ao mesmo tempo se praticar o mal; os dois não podem andar juntos”. - Ah! Qual não foi meu pavor quando com empolgado sadismo disse - “acreditas por acaso, que me falte a arte da lógica e inteligência da astúcia?”- Então a Minos me levou; este, sem demora agarrando a enorme cauda deu nela oito voltas; e mordendo-a, raivoso deu a sentença: - “Para um caso como este, o castigo é permanecer entre as chamas”. - E desde esse instante, fui condenado a viver eternamente envolto em tais vestes, onde me vês lamentando o meu pecado”.
Tendo assim concluído sua narração, aquela chama, agitando-se de um lado para o outro, se foi gemendo.
Então, eu e Virgílio, seguindo pelo rochedo, subimos ao arco que ao nono fosso leva e estão em terrível sofrimento, os que em vida semearam a discórdia.
Obs: não tem figura

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