O por quê da "Divina Comédia"

Desde criança sinto verdadeira atração pelas estrelas. Na fazenda de meu pai, - município de Itabuna – Bahia, não havia iluminação elétrica, por isso, enquanto meus irmãos sob a vigilância de meus pais brincavam como qualquer criança, eu, deitada sobre o gramado ficava a contar e descobrir novas estrelas. Achava lindo, o céu! O luar então me deslumbrava e ainda hoje me encanta. Meu pai, meu grande amigo, homem simples mas inteligente e culto, vendo meu interesse em conhecer os mistérios do Universo, me dava como presente tudo o que encontrava de interessante sobre o assunto, como mapas indicando a posição das estrelas e os nomes das constelações; e outros, dentre eles a “Divina Comédia”. Porém não conseguia ler seus versos; dizia que eram escritos “de trás para a frente”, mas sabia que Dante Alighieri tinha ido às estrelas. Então guardei o livro com muito carinho, pensando: quem sabe, um dia... Passaram-se 55 anos até que em Janeiro do ano 2.000, início do 3º milênio, me veio a inspiração: vou ler, e o que for compreendendo, vou escrevendo; tudo manuscrito. Meditei, conversei com Dante, pesquisei História Universal, Teologia, Religião, Mitologia, Astronomia... durante oito anos.
Agora, carinhosamente, quero compartilhar com vocês o resultado desse trabalho, que me fez crescer como mulher e espiritualmente. Espero que gostem.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

O INF - CANTO XXIXI

CHOREI COPIOSAMENTE
Chegando ao décimo compartimento, os Poetas ouvem as lamentações dos falsários, que aí são punidos com úlceras fétidas e enfermidades nauseantes, Em primeiro lugar os alquimistas, entre os quais Griffolino e Capocchio.
Texto do Tradutor

Chorei copiosamente ao ver aquela multidão sendo corroída por terríveis chagas. Vendo-me assim Virgílio perguntou: “Por que te prendes, à lembrança dos cruéis tormentos desses tristes mutilados e continuas como a procurar alguém em meio a eles? Isso não te aconteceu quando ao passar pelos antros anteriores. Se queres ficar rememorando, a decisão é tua! Já andamos vinte e duas milhas por esse círculo e o tempo que nos foi concedido está passando, e a Lua já se encontra sob nossos pés; preocupes-te, portanto exclusivamente no que ainda está por vir”. Respondi: “Mestre, se soubesses o motivo porque estou eu a olhar por essa multidão de condenados, talvez me tivesse concedido um pouco mais de tempo”.
Mas o Mestre já se tinha ido; e eu o acompanhando continuei minha resposta: “Lá naquela cova para onde tristemente eu olhava, creio que o espírito de algum parente meu está pagando com terríveis sofrimentos os pecados por ele cometidos”. Respondeu-me o Guia: ”Não sofras com isso e procures pensar: se alguém está aqui nesse antro a padecer, é por que merece. Já o tinha visto de dedo erguido em gesto irado, nos chamando, quando ao pé da ponte eu estava; seu nome era Geri Del Bello; não o viste por que estavas a observar o triste semblante daquele que senhor foi de Altaforte, e só o percebeste, quando rápido passava”. (Geri Del Bello - primo do pai de Dante; foi morto à traição, por um dos membros da família Sachetti).
Respondi: “Ó Mestre, o violento crime contra ele cometido e não vingado, talvez tenha sido a causa de ter me apontado com tanta revolta e de haver se esquivado, ao ver-me. E isso me fez sentir maior compaixão do seu sofrimento”.
Já sobre a ponte que levava ao final do profundo fosso de Malebolge se distinguia o imundo recinto e todos os tipos de lamentos e ais; e tanta magoa demonstravam que coloquei as mãos sobre os ouvidos por não suportar os terríveis sons. Mostravam sentir tão penetrante dor como se todas as enfermidades existentes junto aos pântanos de Marena e Sardenha e mais as dos que, suplicantes, vão em busca de remédios nos hospitais de Valdichiana. E do mais profundo daquele fosso, subia fedor igual aos dos corpos quando já em alto grau de decomposição. Chegando até a parte externa oposta, mais claramente vimos o fundo da insana caverna onde, a Suprema e Infalível Justiça, pune a infame raça dos falsários, em eterno padecer.
Viu o povo de Egina seus entes queridos adoecerem; e aos animais a morte trazendo os próprios vermes extinguia; e a terra tornou-se deserta de tal modo que a nova população originou-se das formigas (segundo afirma o poeta), o que fez aquela gente se tornar valente e forte.(Segundo descreve Ovídio, Egina, despovoada pela peste, foi repovoada pelas formigas, que se transformaram em homens).
Tais acontecimentos não causaram a aquele povo maior tristeza do a mim ao ver nessa prisão sombria, sofrimentos tantos e de tão diversos modos que aos condenados afligiam. Vi uns que sobre o dorso se estendiam; outros sobre o ventre se arrastando. Cada um se retorcendo sobre a rocha imunda. Em silêncio e a passos lentos caminhando, vimos e escutamos alguns míseros, prostrados, que em vão se esforçavam para erguer-se. Vi também dois, sentados, um ao outro recostado tentando se apoiarem, quais formas de tortas que, juntas vão ao forno; estavam de cima a baixo, cobertos de feridas podres. E, Iguais a criados quando seu amo os apressa, ou a guardas que de má vontade velando estão e ao verem seu superior se movimentam apressados, assim cada um se agitando em movimentos rápidos, com as implacáveis unhas se arranhava; e atormentados com a terrível coceira iam retirando as horrendas crostas da pele, como se faz com o peixe ao se retirar as escamas.
Então Virgílio falou a um dos dois: “Ó tu, que tens os dedos transformados em tenazes para com tanta fúria retirar do corpo a última pele, dize-me se, entre estas almas que sofrem terrível castigo existe alguma que é de italiano. Se responderes a minha pergunta, desejo que tuas unhas sejam capazes de servi-lo eternamente!”. Lacrimoso, responde um dos dois padecentes: “Somos italianos. E tu, quem és e por que me interrogas?”. Respondeu-lhe meu Guia: “Sou quem, de círculo em círculo a este homem ainda vivo conduz para lhe mostrar o pavoroso Abismo”. Então os dois, separando-se um do outro a mim se voltaram, cada qual tremendo mais; e a turba que ao redor estava, imitou-os. Meu Guia de mim se aproximando, disse: “Pergunta-lhes agora, o que desejas saber”. E eu lhe obedecendo, comecei: “Dize-me quem sois e de onde vieste. Não vos envergonheis de nos dizer o que causou a vossa imunda punição”.
“Fui de Arezzo”, - disse um deles – “fui queimado vivo por Alberto porque tendo dito eu por brincadeira que, “eu poderia voar pelos ares” e sendo ele curto de entendimento, desejo ardente teve de saber como isso seria feito; então, houve uma enorme confusão; por eu não ter podido satisfazer seu desejo tornando-o um novo Dédalo, fui mandado à fogueira por aquele que o tinha por filho; porém, caí no último dos fossos, por sentença rigorosa de Manos; meu crime foi, a traiçoeira alquimia”. (Griffolino d´Arezzo, alquimista, foi mandado à fogueira por Alberto de Sena.)
E ao Poeta disse eu: “Pode ter existido gente tão vaidosa quanto o povo de Sena? Nem a da França tem sido igual!”.
Então, o outro leproso me acena e com ironia disse: “Sem incluir Stricca, homem avarento que a qualquer gasto a mais, condenava como sendo desperdício; também Caccia d´Ascian, com Abbagliato e seus companheiros, com os quais esbanjava bosques e vinhedos; com a esgrima, contra cachos de uva vaidosamente lutava; até mesmo Nocoló, aquele que descobriu do cravo a especiaria, deixando seu uso enraizado. Para que saibas com certeza quem, desse modo contra os bens de Sena também assim atuava, firma teu olhar no meu triste semblante. Pelo que vês, certo já estás de que o alquimista Capocchio, era falsificador de metais, por meio da alquimia”. (Todos eles foram de Sena e conhecidos como dissipadores de dinheiro.)

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