“AGRADECIDO A DEUS ELEVA A MENTE.
CHEGADOS SOMOS À
PRIMEIRA ESTRELA.”
Sobem à Lua.
Exortação aos leitores. Dante pergunta a Beatriz se as manchas da Lua dependem
da maior ou menor densidade do astro. Beatriz corrige o erro. Todos os astros
são iluminados pela virtude que o primeiro móvel se difunde aos céus sob-postos.
Na Lua a virtude é menor que nos outros céus. Texto do Tradutor.
A Lua= Primeiro Céu
Vós que desejosos de
ouvir estais a navegar em frágil
barca seguido minha embarcação que vai
velejando entre Cantos, voltai aos portos de onde haveis partido (Frágil barca: pouquíssimo conhecimento;
Dante fala aos leitores que não possuem preparo suficiente para diferenciar a
realidade da fantasia, conhecimento necessário para compreender seu Paraíso); evitai o alto mar porque se eu me perder
podereis perder vosso rumo também. Ainda ninguém percorreu mares iguais ao que
eu vou navegando. Inspira-me Minerva; Apolo me conduza e o rumo a seguir
indiquem-me as Musas.. E vós os raros entre os outros que a tempo concentrastes
a mente neste Pão dos Anjos (ciência
divina; na teologia = Deus) que ao espírito alimenta mas, não sacia
a quem ainda sobre a terra está, sem temor vossa nau levai ao extenso oceano
seguindo nas águas a minha esteira enquanto nela o seu sulco se apresenta. Ficareis mais atônitos do que Jasão ficou em Colcos quando, após ter semeado a
terra surgiu gente guerreira. (
Ovídio: Os argonautas, que se espantaram quando Jasão arando o campo com dois
touros que expeliam fogo pelas narinas e semeando na terra os dentes do monstro
que havia matado do solo surgiram guerreiros).
O incessante desejo de buscar as alturas (buscar Deus) nos impulsionava. Beatriz olhava para o alto e eu a olhava; subia mais rápido do que a seta ao se desprender do arco indo em direção ao alvo. De repente fui atraído para algo maravilhoso quase um diamante atingido pela luz do sol. Beatriz conhecendo meus pensamentos voltou-se em minha direção e tão alegre quanto bela disse: “Agradecido eleva teu pensamento a Deus pois, acabamos de chegar à primeira estrela” (à Lua). Senti-me como se estivéssemos cobertos por espessa nuvem brilhante sólida e polida qual diamante; no centro daquela pérola eterna penetramos como um raio de luz penetra na água que o recebe no seu interior sem abrir fenda. Se eu ainda estava no meu corpo, não poderia compreender como é possível que um espaço seja ocupado por outro espaço ao mesmo tempo sem que um corpo penetrasse outro. (Tendo Dante um corpo sólido, portanto um espaço ocupado e sendo a lua igualmente sólida portanto, um espaço também ocupado, como se poderia compreender ter Dante penetrado no corpo da lua com a matéria - o corpo físico - unificada ao espírito). Esse prodigioso mistério despertara em nós o desejo de ver a Suprema Essência que uniu a Natureza Humana com a Divina (Jesus Cristo). Ali a realidade se apresentava com a aparência daquilo que se acredita por força da fé, sem exigência de provas, considerando-a como verdade principal a que o homem se deve prender.
Então, comovido eu lhe disse: “Com o espírito devotado curvo-me humildemente perante Àquele que me tem distante do mundo dos mortais. Mas, explique-me o que são as manchas escuras que neste céu aparecem fazendo com que na Terra se criassem fábulas referentes a Caim”. (segundo uma crendice popular as manchas da Lua representavam Caim carregando um feixe de espinhos). Ela então sorrindo respondeu-me: “A inteligência humana sempre erra quando não usa a chave da sabedoria para lhe abrir as portas do conhecimento. Em ti correto seria não ficar admirado pois já tens noção de como pouco se aprende quando a inteligência busca apenas aquilo que os sentidos alcançam. Mas, dize-me: Que ideia fazes sobre essas manchas?”.
Respondi: “Acredito que isso aconteça por alguns corpos serem grossos (densos, isto é: onde a massa é compacta), outros finos (raros, isto é: onde faltam massas.)”.
Ela então replicou: “Se ficares atento ao que te apresentarei bem claramente verás que esse teu entendimento não corresponde à verdade. Na oitava esfera (oitavo céu) brilham muitos astros que se diferenciam uns dos outros pelo aspecto e qualidade da luz por eles emitidos. Se a densidade ou a raridade fosse a origem das sombras ou das luzes, todos os astros celestes possuiriam as mesmas propriedades e teriam aparências mais ou menos iguais. Para que existam variedades de aspectos (efeito) é inevitável que sejam procedentes de princípios formais diversos (causa); mas, de acordo com seu modo de pensar todos os princípios da causalidade, menos esse que você acredita, deveriam ser destruídos; e também se as manchas que aqui aparecem fossem causadas por falta de matéria lunar, em algum ponto deste planeta (da Lua) poderia se ver partes vazias, ocas, como se pode observar no corpo de um animal entre o músculo e a gordura; se assim fosse, por ocasião dos eclipses sob os efeitos da luz esses espaços vazios seriam bem visíveis. Mas não é o que acontece. (Se a Lua tivesse partes transparentes não haveria a possibilidade de se verificar o eclipse do Sol. Se as partes rarefeitas fossem transparentes deveria haver o oposto delas, como num espelho, partes densas que impedem a transparência. Nesse último caso porém os raios externos deveriam refletir-se como espelho).
"Quanto a ideia de que o denso e o raro estão em camadas alternadas poderei demonstrar que também está errada. A parte menos densa não sendo transparente, neste corpo deve haver um limite por onde a luz não possa ser atravessada e sobre si a luz como também a cor, se tornariam intensas. É o que acontece com o vidro quando o chumbo é colocado em um dos lados. Dirás que ai a densidade do chumbo impediu a passagem da luz podendo ser refletida à maior distância. Por ser o Sol fonte de toda a existência dele poderás fazer uso como experiências: se de três espelhos colocares dois a um intervalo de modo que o terceiro fique mais distante dos dois primeiros, estando uma luz colocada de forma tal que em todos eles estejam refletida, olhando-as verás que apesar da imagem refletida no espelho mais distante pereça menor, com igual intensidade a luz resplandece. Como pelo calor do sol o orvalho se derrete e se esvai deixando surgir o que ela ocultava, assim teu engano desapareça.
"Lá no Céu da Paz Divina gira a enorme força cuja virtude tem a capacidade de comandar tudo o que nele está contido pois ela é a origem da vida. (no Empíreo o primeiro móvel que influencia os outros céus e situa-se acima de todos eles). No céu seguinte repleto de astros, aquela força ou ser se divide por várias naturezas distintas mas que nela se encerra. Os outros Céus um sempre abaixo do outro – por várias influências – dispõe de diferenças que lhes fornece tudo o que é necessário aos seus fins e consequências. Estais percebendo pois, que cada parte desse conjunto segue divisões de espaço que não varia. O que abaixo acontece vem sempre do de cima.
"Já compreendeste como é seguro o caminho por onde deves seguir para chegar à desejada verdade; depois poderás atravessar o vau sem necessidade de guia. A atividade dos Céus desta forma revelada deve ser atribuída aos santos motores como ao artífice é atribuída a força do martelo (atribuída aos anjos que agem em cada nível dos Céus). E o Céu que tantas estrelas no seu espaço movimenta e o faz belo, a imagem do Supremo nele a imprime como selo. E como a alma que a humana argila atuando por todo o corpo diversas capacidades lhe transmite, assim a Inteligência nos milhões de astros se multiplicando sobre sua Unidade a Sua benevolência vês girando”.
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