O por quê da "Divina Comédia"

Desde criança sinto verdadeira atração pelas estrelas. Na fazenda de meu pai, - município de Itabuna – Bahia, não havia iluminação elétrica, por isso, enquanto meus irmãos sob a vigilância de meus pais brincavam como qualquer criança, eu, deitada sobre o gramado ficava a contar e descobrir novas estrelas. Achava lindo, o céu! O luar então me deslumbrava e ainda hoje me encanta. Meu pai, meu grande amigo, homem simples mas inteligente e culto, vendo meu interesse em conhecer os mistérios do Universo, me dava como presente tudo o que encontrava de interessante sobre o assunto, como mapas indicando a posição das estrelas e os nomes das constelações; e outros, dentre eles a “Divina Comédia”. Porém não conseguia ler seus versos; dizia que eram escritos “de trás para a frente”, mas sabia que Dante Alighieri tinha ido às estrelas. Então guardei o livro com muito carinho, pensando: quem sabe, um dia... Passaram-se 55 anos até que em Janeiro do ano 2.000, início do 3º milênio, me veio a inspiração: vou ler, e o que for compreendendo, vou escrevendo; tudo manuscrito. Meditei, conversei com Dante, pesquisei História Universal, Teologia, Religião, Mitologia, Astronomia... durante oito anos.
Agora, carinhosamente, quero compartilhar com vocês o resultado desse trabalho, que me fez crescer como mulher e espiritualmente. Espero que gostem.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

O Purg. CANTO VI


Dante promete às almas que a ele se recomendam que não se esquecerá delas quando voltar ao mundo dos vivos. Os dois Poetas encontram o poeta Sordello, o qual, ao ouvir o nome da sua pátria Mântua abraça o mantuano Virgílio. Esse episódio move Dante a uma violenta invectiva contra as divisões e guerras internas que devastam a Itália.

Texto do Tradutor

"Agora vamos andar mais rápido"

Quando um jogo de zara (de dados) chega ao final, o que perde amargurado e solitário põe-se a ensaiar alguns lances que poderiam ter sido à seu favor. Os torcedores partem acompanhando o vencedor. Uns o cercam pela frente, outros o seguram por trás; os que estão ao lado pedem deles se lembrar; sem deter-se dá atenção a este e àquele; ao que lhe alcança a mão dela rápido se defende. Assim cercava-me a enorme multidão; ora a um, ora a outro me voltando, com promessas consegui me livrar de todos eles.

Ali estava o aretino que perdeu a vida por horrendo golpe aplicado por Ghin Tacco; (o juiz Benincasa – de Laterina – que foi assassinado pelo famoso bandoleiro Ghino del Facco) e também outro aretino que em perseguição ao inimigo se afogou. (Gercio Tarlati; morreu afogado no rio Arno, perseguindo os inimigos derrotados numa batalha). Rogando-me em sentida súplica, estava também Frederico Novello (morreu ao tentar socorrer Talati); e ainda, aquele pisano por quem seu pai Mazzucco, teve grande atitude. (Farinata degli Seornegiani, morto à traição. Seu pai Mazzuco, que se fizera frade, perdoou o assassino do filho.) Vi também o Conde Orso, (degli Albert, morto por seu primo) e aquele que sofreu terrível morte, não por ter alguma culpa, mas por ódio e inveja; (médico de Felipe III de França; enforcado sob falsas acusações); e o causador dessa morte que agora impera no Brabante (Pier della Broccia) se apresse em se penitenciar senão será levado a fazer companhia a maldita plebe, lá onde poderá sofrer terríveis suplícios.

Quando enfim pude me livrar daquela multidão aflita que suplicava preces para abreviar sua entrada na Celestial Mansão, perguntei ao meu Guia: “Em teu livro, ó douto Guia, afirmas textualmente que a oração não tem força bastante para modificar as disposições divinas; no entanto, essa multidão pede-as com ansiedade; seria vã sua esperança ou não pude compreender o que afirmavas?”

Respondeu-me: “Fui bastante claro na minha afirmação; e a esperança dessa gente não é inútil. A Justiça Divina não se modifica mesmo quando o pecador padecente é redimido por meio de fervorosas preces. Lá expus o pensamento afirmando que, por estar distante de Deus, aquele que suplicava nenhuma oração poderia ter valor. Porém, esse imenso problema para a inteligência, te será brilhantemente esclarecido. Por quem? Por Beatriz que risonha e feliz verás quando alcançares o cume desta montanha”.

Respondi: “Mestre, Agora vamos andar mais rápido; pois não sinto a menor fadiga como antes e já estou percebendo a sombra do cume da montanha”.

Continuou o Mestre: “É preciso prosseguir na caminhada, porém de acordo com nossas forças e enquanto tiver luz do dia; também não te enganes quanto aos teus desejos, pois as coisas não são tão fáceis como pensas. Antes de chegarmos ao cume, aguardarás a volta deste astro que está oculto agora pela encosta da montanha; seus raios ainda não desapareceram. Vê do outro lado aquele espírito solitário que atento nos aguardada; ele nos dirá qual o melhor caminho por onde devemos seguir”.

Chegamos. Ó nobre alma lombarda! Como se mostrava altiva e desdenhosa movimentando os olhos, grave e lentamente! Então, encarou-nos e, majestosa qual leão em seu repouso nos deixou aproximar, observando-nos em silêncio. Virgílio aproximou-se dela, pedindo que nos mostrasse a melhor subida. Ao invés de responder, perguntou qual foi a nossa pátria e a nossa vida. Meu Guia tinha começado a lhe responder: “Em Mântua...” quando aquela alma, comovida, de onde estava a ele se atirou dizendo: ”Sou Sordello e lá também nasci”. E os dois se abraçavam estreitamente. (Sordello de Visconti; poeta, jurisconsulto e guerreiro, do século XII).

Ah! Escravizada Itália, morada da aflição; nau sem comando em mar tenebroso; outrora rainha, agora transformada em prostituta. Esse espírito nobre e amável, somente ao escutar o nome da doce terra, logo ao patrício acolhe carinhoso enquanto os vivos, no teu solo, em sangrenta guerra, atiram-se ferozmente uns contra os outros aqueles que nascem e crescem entre os mesmos muros. Ó mísera Itália! Onde, em teu solo, poderá tua infeliz gente encontrar a paz? Cuidadosa, abriga-a sob teu manto aconchegando-a em teu seio. Em vão Justiniano veio te tomar as rédeas, pois tens ainda vazia a sela; maior vergonha te causou a tentativa de comando. (O Imperador Justiniano, que consolidou a legislação romana.) Ah! Cúria Romana! Cuida dos teus deveres religiosos e deixa o Imperador governar o país conforme decretou Cristo! Vê como a falta de domínio aguçou a fera dos maus instintos depois que mãos sem habilidade a está governando.

E tu, Alberto de Germânia, tão inteligente, mas, tão jovem que me causou espanto ter se tornado o sucessor do Imperador, reflitas agora, pois deverias tê-la governado antes de que tudo isso acontecesse! (Alberto l, filho do Imperador Rodolfo; eleito em 1.296). Justo castigo do Céu deverão tu e teu pai receberem por estarem ausentes em terra estranha por cobiça, enquanto permitem que o Jardim do Império esteja abandonado. Com indiferença, vês Capelleti e Montecchi (famílias de Verona) entristecidos, em tamanha aflição! Vês também, Monaldi e Filisppeche (famílas de Orvieto) alvos da própria fúria. Vem insensível! Vem ver teus fiéis seguidores oprimidos e procura amenizar seus sofrimentos! Vai até Santafiori (castelo e feudo imperial nas vizinhanças de Sena) para ver como eles estão sendo tratados! Vem ver tua Roma! Viúva e abandonada não se cansa de chorar e a todo instante clama: “Vem, César, vem! Não deixe minha esperança morrer!” Vem ver o amor que ainda existe no povo e se por nós não te move piedade, mova-te por zelo à tua fama! Se me é permitido perguntar, ó Supremo Deus sacrificado por amor aos homens, não Te comoves por nos ver sofrendo tanto ou, no abismo insondável da Tua sabedoria já está preparado para nós algum bem que nos é vedado conhecer? Um imenso tropel de tiranos subjuga muitas cidades da Itália e, qualquer (Cláudio Marcelo, adversário de Júlio César). dizendo-se inofensivo à pátria Ó minha Florença, esse episódio a ti não se refere, pois sempre ser um desses facínoras pode se tornar um Marcelo, viste de modelo a muitos povos. (Essas palavras de Dante, são de ironia contra sua terra natal) Enquanto muitos trazem na mente e no coração o desejo de vingança, aguardando para isso apenas a oportunidade, teu povo justiça a têm nos lábios permanentemente. Enquanto muitos não aceitam encargos públicos, teu povo solícito grita: “Estou pronto!” Alegra-te, pois o mundo reconhece em ti prudência, paz e riqueza! Digo a verdade e disso ninguém duvida. Atenas e Esparta que se elevaram às alturas por leis e instituições, viveram na incerteza; o que será de ti, ó Florença, que tens revogado em novembro, leis que foram aprovadas em outubro, e em curto período de tempo,foram transformadas leis, moedas, hábitos antigos e tradicionais, modificando até mesmo o temperamento e as atitudes de seu povo? Se vês com clareza, hás de te comparar a um enfermo que se agita no leito, procurando em vão aliviar e dor.

Não tem figura